Móveis Coloniais de Acaju

Móveis  Coloniais de Acaju (Foto: Divulgação)

FEIJOADA BÚLGARA II – A MISSÃO
O Móveis Coloniais de Acaju prepara um novo levante para tomar de assalto o pop nacional com seu segundo álbum
Por Eduardo Carli de Moraes, de São Paulo

abril pro rock 2009Eles não são somente uma banda: são uma comunidade neo-hippie. E vêm aí, a todo gás, convidando-nos a aderir à seita! E quem há de resistir? Na estrada desde 1998, o Móveis Coloniais de Acaju, se prepara para lançar seu segundo petardo. Compl_t_, o aguardado disco novo do super-grupo de Brasília, desembarca prometendo ser um dos grandes acontecimentos no pop tupiniquim em 2009. A banda também faz um aguardado show nesta edição do Abril Pro Rock, próximo dia 18 de abril no Recife

O álbum foi produzido pelo gabaritado Carlos Eduardo Miranda (que já trabalhou com Skank, O Rappa, Cordel do Fogo Encantado e Cansei de Ser Sexy, entre outros) e será disponibilizado para download gratuito no site da Trama Virtual neste mês de Abril. Profetizar que será um grande sucesso não é risco algum: nada parece mais plausível do que vermos o Móveis tomando o pop de assalto e tornando-se uma das maiores bandas desse país.

Mas a responsa é grande: depois de terem lançado um dos álbuns de estreia mais elogiados que uma banda nacional lançou nesta década, eles retornam tendo que fazer jus às altas expectativas dos milhares de fãs que já conquistaram. O disco novo chega tendo várias missões na mira: tentar transpor para o estúdio todo o punch e paixão que demonstram em cima do palco; provar que a criatividade está intacta mesmo depois da perda de um membro-chave (o guitarrista e compositor Leonardo Buzrstyn, que mudou-se para os EUA); e dar mais uns passos em direção ao mainstream nacional,onde o vácuo deixado pelo hiato dos Los Hermanos solicita um preenchimento à altura.

O grupo é composto por nada menos que 10 músicos, o que já torna a sonoridade bem mais rica do que a média, com a presença de instrumentos que incluem flauta transversal, sax, trombone, gaita e escaleta, entre outros. Talvez pelo tamanho grandalhão da turma, o som do Móveis seja tão variado e aventureiro, síntese de influências das mais diversas. Definir o som da banda, além de tarefa ingrata, seria um mutilamento: eles soam ora como uma banda de ska que gosta de Jorge Ben, ora como uma big band de jazz com tempero MPB, ora como rock and roll de maconheiro ou como um samba-funk de malandrão – daqueles pra ouvir num churras, em dia de Sol escladante, com muitas geladas e direito a uma pelada de futebol… Uma verdadeira “feijoada búlgara”, como eles mesmos curtem se auto-definir.

Talvez dê para encontrar similaridades com big-bands gringas como o Big Bad Voodoo Daddy ou o Royal Crown Revue. E no Brasil talvez seja possível enxergar no Karnak um grupo precursor dessa zoada salada mista. Mas o Móveis na verdade soa fresco e original como pouca coisa que veio antes deles. E o que é soa ainda mais inaudito e surpreendente é a performance ao vivo dos caras, que já deixou muita gente boquiaberta e encharcada de suor pelos palcos por aí. Não é à toa que ganharam reputação de terem um dos shows mais espetaculares do Brasil: em carne e osso, os malucos são uns alucinados.

Móveis  Coloniais de Acaju (Foto: Divulgação)

Vivo

O Móveis ao vivo é pura catarse: chove sobre o público uma tempestade de energia bruta e excitação descontrolada, num ritual hedonista festeiro que é capaz de nos levar a um estado quase de Êxtase. O vocalista André González parece um molecão anfetaminado que pula, se contorce, se esgoela e se esparrama pelo chão e pelos ares, sempre com a energia no talo, como um coelho da Duracell chapadaço que está sempre com as pilhas repletas. Ele canta como faria um Frejat mais punk e desencanado, um Amarante de cabelo-sujo ou um Julian Casablancas mais extrovertido e sacana. E sempre se entregando com toda a alma à performance.

Já os homens dos metais, pisoteando os clichês que mandam os músicos ficarem quietinhos num canto do palco, saem correndo feito uns insanos, fazem micagens e macacagens, bolam dancinhas curiosas – tudo com o som rolando. Quem já viu sabe: a banda inteira parece morrendo de tesão de estar ali, envolvida nesta experiência que apaga os contornos entre público e artista e nos junta a todos na mesma festa, no mesmo lugar do caralho, “todos juntos numa pessoa só” (como diriam os Mutantes sob efeito de LSD). Num show dos Móveis, nem é preciso ácido para que estejamos todos juntos numa pessoa só. E isso é um dos maiores elogios concebíveis que se pode fazer à performance ao vivo de uma banda. A banda compele o público a pogar e pular mesmo quando estão tocando (pasmem!) uma cover do Portishead!

Enquanto o álbum novo não sai e uma nova turnê não se inicia, um tira-gosto do futuro do Móveis já está disponível no site oficial da banda e no YouTube: vídeos da banda tocando ao vivo todas as músicas de Compl_t_. À primeira audição, as novas composições parecem um tanto menos saborosas no quesito literário, o que talvez se explique pela saída do (ex)guitarrista Leonardo Bursztyn, que compôs as letras (geniais) de “Perca Peso”, “Aluga-se Vende”, “Copabacana” e “Menina Moça”, dentre outras pérolas do primeiro disco. (Bursztyn, que já demonstrava ser uma mente brilhante na música, está fazendo doutorado em economia na Univerdade de Harvard, prova de que é tem mesmo uma puta cabeça).

O “novo Móveis” não possui mais a sátira social cáustica que se via em “Perca Peso” (que zoava, por exemplo, os ricaços que levam o cachorro ao cabeleireiro). Nem tem mais a constelação de referências engraçadinhas, levada ao extremo em músicas como “Copabana” (que juntava Gorbatchev, Corvettes, marajás, perestroikas, chás, iôgas e dicionários numa bizarra e irresistível canção de amor). Também ficam para segundo plano as citações culturais às pencas, que iam de Kafka (cujo Gregor Samsa, protagonista do clássico A Metamorfose, torna-se Gregório Sansonite na música “E Agora, Gregório?”) à Fellini, Buñuel, Pasolini e Fidel (que são imaginados juntos, numa roda de samba em Havana, em “Receio do Remorso”).

Esta “aura cult” aparece bem atenuada nas músicas novas, dando a impressão de que o Móveis tornou-se uma banda mais simples e direta, com “riffs” de metais sempre certeiros e melodias memoráveis, mas cujas palavras carregam menos ambição e soam menos lúdicas. A faceta mais crítica e sarcástica praticamente sumiu (a não ser, talvez, em canções como “Cheia de Manha” ou “Para Manter Ou Mudar”). As músicas de amor parecem tomar o primeiro plano: “Cão Guia” é uma prova de que ainda é possível compor uma cancioneta romântica que soa original.  “Adeus” traz bonitas promessas do eu-lírico à sua musa: “refaço meus planos para rimar com os seus / eu trago meus sonhos pra sonhar aos seus”. Em “Falso Retrato”, a tônica é mais de hostilidade (“não me enquadro com você”), enquanto que “O Tempo”, single candidato a hit, traz pílulas de filosofia sobre o quanto o amor distorce nossa percepção temporal, engatinhando ou acelerando como se obedecesse às batidas do coração.

Sim, o Móveis Colonias de Acaju tem tudo para conquistar as multidões – e seria uma glória merecida. Se a fama, que provavelmente virá mais forte do que nunca agora, será benéfica ou danosa, só o tempo dirá. Mas dá pra profetizar que um grupo tão seguro de si, e que faz tudo dando passos tão firmes, será um edifício sólido que não vai se abalar com as ventanias do pop. Os caras vieram para ficar. E não há nem sinal de cupins roendo o coração destes flamejantes móveis coloniais.

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