Kali Uchis
Orquídeas
Geffen, 2024. Gênero: Pop, R&B
Kali Uchis deliberadamente vem alternando discos em inglês e espanhol como se mirasse dois públicos distintos, mas a estratégia tem uma razão ainda mais ambiciosa, uma vontade de mostrar que não pode ser restrita a um único nicho, como é conveniente à indústria pop. Após o ótimo Red Moon in Venus, do ano passado, a artista americana-colombiana retorna com o seu melhor disco cantado em espanhol, Orquídeas. Kali mais uma vez mostra seu potencial para explorar suas raízes latino-americanas sem deixar de inovar dentro de gêneros como R&B e eletrônica.
Orquídeas representa bem o espírito inquieto de Kali Uchis, uma artista com um controle preciso de sua própria estética, mas que nunca se mostra acomodada, como se estivesse em uma busca constante desde que estourou com Isolation (2018). Se por um lado, ela explora os contornos conhecidos e esperados de uma artista latina, como a sensualidade evidente e empoderada, por outro ela surpreende com suas referências futuristas, a nostalgia noventista e os acenos a um pop mais experimental e alternativo.
No centro de sua poética está uma mulher complexa, cheia de inseguranças, sonhos, amores não-correspondidos, mas em Orquídeas ela é também forte, alguém que não abre mão de buscar o que deseja. Fluindo do espanhol pro inglês em alguns momentos, ela se mostra luxuriosa em faixas como “Young Rich & Love” (“Em cima de você eu me sinto livre”) e poderosa e controladora em “Diosa” (“Sabes bem que sou muito mulher / e pode ser que isso te assuste”). Em “Perdiste”, ela segue com a autoestima intacta após um término, como nos versos “você me perdeu, baby / isso é triste”, mas se mostra mais vulnerável em “Tu Corazón Es Mío”, em que fala sobre fidelidade e vida a dois.
Uchis aprofunda ainda mais a experimentação dos ritmos latinos com a produção contemporânea de pop e eletrônica, como já fez em Sin Miedo, seu disco em espanhol de 2020. Aqui ela mistura cumbia com rap na divertida “Muñekita”, ao lado do dominicano El Alfa e JT (do City Girls) e mete um reggaeton com beats eletrônicos em “Labios Mordidos”, ao lado de Karol G. No single lançado anteriormente, “Te Mata”, ela homenageia os boleros antigos com uma interpretação perfeita que remete à nostalgia oitentista facilmente reconhecível. Essa faixa conversa bem com o encerramento do disco, “Dame Beso // Muévete”, outra faixa que soa como uma homenagem de Uchis às suas raízes latinas.
Orquídeas sedimenta Kali Uchis como um tipo único no pop hoje, uma artista no controle de sua estética e visão únicas, que não se contenta com o que lhe foi predeterminado pela indústria.
Ouça Kali Uchis – Orquídeas
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