“La Belle de Jour” é uma das canções mais famosas de Alceu Valença, retratando uma paixão pela “moça bonita da praia de Boa Viagem na tarde de um domingo azul” que ganhou o Brasil. Essa foi a inspiração para o multiartista, cantor e compositor independente Juan Guiã criar a faixa “La Belle Juju”, lançada no dia 20 de fevereiro e que ganhou um videoclipe lançado nesta quinta (29)
Ambas as músicas têm Recife como cenário e retratam o amor acontecendo em suas praias. Mas as semelhanças entre “de Jour” e “Juju” acabam por aí. Enquanto Alceu explora o amor romântico, escrevendo um blues para uma moça de olhos azuis, Juan canta o amor entre amigos e afetos casuais em uma outra perspectiva de Recife: a de jovens LGBTQIA+.
“Sou muito feliz de fazer o que eu faço. Hoje, com a música, consigo explorar um pouco de tudo que já fiz no teatro, em performance, em vídeo, na música, no palco e poder ser um instrumento do lugar onde eu vivo, das questões que são importantes de serem debatidas no todo. É o que para mim, faz sentido. ‘La Belle Juju’ é sobre nossas vivências. Sobre propor e imortalizar narrativas de um Recife que também é feito pela diversidade. Leve, quente, despretensioso e apaixonante”, afirma o cantor
Dimensão Cruzada
Com produção musical de Markim, “La Belle Juju” traz uma sonoridade pop misturada com pagodão baiano e timbres nordestinos e composição e interpretação de Juan Guiã. A canção faz parte do EP “Dimensão Cruzada”, que tem previsão de lançamento no início do segundo semestre de 2024.
Além do pagodão, o segundo EP do multiartista recifense traça sua sonoridade a partir de outros ritmos nordestinos. “Tem músicas que tem brega-funk, pagodão, forró. Eu faço essa brincadeira e acho que é algo que eu vou fazer sempre, manter as minhas raízes de alguma forma, nem que ela seja expressada na sonoridade, ou nas imagens ou nas referências visuais ou na história. Acho que a cultura nordestina faz parte da minha criação como artista independente, como um artista criador.”, revelou Juan em conversa com a O Grito!.
Toda a inspiração nestes gêneros regionais vem revestida pela influência da música pop, que já é presente nos lançamentos anteriores do artista desde sua estreia musical em 2018, com o EP Também Sou Feito de Infernos, mas agora engata de vez em produções mais agitadas e dançantes. Uma virada de estilo que vem pela vontade do cantor de mostrar outras facetas artísticas.
“Eu acho que [a mudança] tem muito mais relação, na verdade, de assumir esse lugar da diversidade, de me entender como uma pessoa e como um artista múltiplo, diverso, que tem muitas camadas diferentes. Então, tem essa ideia de abordar em cada música, cada single, um universo diferente meu.”
Arte independente no Brasil
O videoclipe de “La Belle Juju”, lançado em 29 de fevereiro, tem roteiro do próprio Juan, que também assina a direção de arte, direção geral com assistência de Iyadirê Zidanes e Fanny França, direção de fotografia com Morgana Narjara e a coreografia, assistido por Deh Julio. A direção de produção é de Regina Guimarães e assinam a produção executiva Fanny França, Iyadirê Zidanes, Henri Farias e Regina Guimarães.
O acúmulo de funções dentro de seu trabalho ressalta a realidade de artistas independentes no Brasil que, sem recursos, criam seus meios para se expressar. É este o tema, inclusive, do documentário “Arte de Dentro”, produzido por Juan Guiã e que aborda a arte independente pelo olhar de três artistas nordestinos.
“Para mim, viver a arte nunca foi uma decisão. Foi uma coisa que eu fui entendendo e aceitando, com o tempo, que aquilo fazia parte de mim, da minha força natural. E é por meio dela que eu respiro, que eu me movimento, que eu me curo”, conta Juan no documentário.
“No meu primeiro trabalho independente, eu entendi que eu estava sozinho na arte de criar, mas que ela também só aconteceria de forma coletiva. As pessoas vão se agregando porque elas têm coisas em comum a serem ditas. Reconheço a potência da arte independente de comunicar e transformar por meio do coletivo. Não é sobre ganhar algo. Existe uma força coletiva que faz com que aquele trabalho seja único”, diz o multiartista. “Ao mesmo tempo, é muito doloroso e sofrido fazer tudo de forma artesanal e limitada por não ter acesso à tecnologia e estrutura. Você não pode expandir e ir ao limite das suas potências porque não existe fomento e capital. Então, temos que criar da forma que dá”, desabafa.