Diretor discute a revolução digital no jornalismo em novo documentário que chega aos cinemas
Por Karen Lemos
De São Paulo
O mesmo olhar crítico das ficções O Homem que Copiava, Meu Tio Matou um Cara e Saneamento Básico, O Filme está em O Mercado de Notícias, novo longa-metragem de Jorge Furtado, eleito melhor documentário pelo júri oficial e popular do 18º Cine PE.
O filme chegou aos cinemas de dez cidades: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Salvador, João Pessoa, Santos e Juiz de Fora (as datas das demais cidades ainda não foram anunciadas).
Desta vez, o tema é a explosão digital e sua influência no jornalismo que está em plena e ainda pouco compreendida mudança. Apaixonado por notícias (“não vivo sem elas”, confessou), Furtado decidiu mergulhar nessa discussão até por uma questão pessoal. “Eu tinha uma dívida a sanar, já que larguei o curso de jornalismo para fazer cinema”, explicou durante a pré-estreia de seu novo trabalho em São Paulo.
Decidido a investigar causas e consequências desse novo jornalismo na era dos blogs e das redes sociais, o cineasta voltou ao passado para entender o nascimento da imprensa e acabou descobrindo uma pérola: a peça The Staple of News, de Ben Jonson, datada de 1625. “Nunca tinha ouvido falar dessa peça e descobri que era pouco conhecida mesmo, tanto que eu precisei traduzi-la para o português”, recordou.
Mas, o que teria a ver um texto do século 17 com os dias de hoje? Tudo, segundo Furtado. “Usei a peça como um guia, pois me pareceu extremamente atual”. E de fato é! A briga pelos interesses por trás de uma reportagem, a apelação para fazer do fato o mais atraente possível aos olhos do leitor e o dinheiro que passeia nos bastidores da notícia são explorados sem acanhas em um texto escrito há quase 400 anos.
Além da peça, O Mercado de Notícias trabalha com mais duas linhas que, juntas, formam o tripé do documentário: entrevistas com jornalistas conceituados (como Cristiana Lôbo, Luis Nassif, Mino Carta e muitos outros), cenas da peça filmadas especialmente para o longa-metragem e pequenas ‘reportagens’ que é o próprio Furtado quem investiga para alimentar sua alma de jornalista.
Duas dessas reportagens merecem menção. Uma delas é o caso da bolinha de papel que atingiu o político José Serra durante sua campanha eleitoral. Furtado usa vários pontos de vista para debater as muitas interpretações feitas pelos veículos de comunicação na ocasião do ocorrido.
Outro destaque é o Picasso do INSS – um quadro assinado por Pablo Picasso que repousa em uma das salas do Ministério da Previdência Social em Brasília. O fato ganhou até capa de jornal quando noticiado. Como já havia estudado artes plásticas, Jorge Furtado percebeu que o quadro se tratava, na verdade, de uma reprodução da obra original, atualmente exposta em um famoso museu de arte na Alemanha.
Apesar do cenário beirando ao catastrofismo, o cineasta diz manter uma visão otimista para o futuro. “Ao menos mais otimistas do que os meus entrevistados no filme”, explicou. “Na minha opinião, o jornalismo está vivendo sua era de ouro; depois dessa confusão que a internet proporcionou, vamos saber o que realmente está por vir”.
Em uma de suas frases no documentário, o jornalista Fernando Rodrigues declara ser difícil entender uma revolução quando ela está acontecendo. E é com esse fio de esperança que Jorge Furtado faz sua defesa. “Existe uma tendência de menosprezar a tecnologia, mas ela não só transforma como também se soma a outros meios”, pontuou. “Disseram que o vinil estava acabado, mas estou até hoje comprando discos”.