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Jáder une piseiro, forró e pop latino no disco Quem Mandou Chamar??

Estreia em carreira solo do artista pernambucano exalta regionalidade ao mesmo tempo em que fura a bolha dos padrões de gênero

Jáder une piseiro, forró e pop latino no disco Quem Mandou Chamar??
4.5

Tudo começa com um teclado sintético, seguido do choro da sanfona que se incorpora às batidas do piseiro. Em seguida vem um triângulo discreto e um som eletrônico. E enfim temos “Eu Digo Não”, música que abre o álbum Quem Mandou Chamar?? do cantor e compositor pernambucano Jáder. A mescla de elementos da primeira faixa já dá uma prévia do que o artista construiu ao longo do disco. Introduzindo os trabalhos com uma sofrência dançante de quem não quer perdoar uma desilusão, o artista chama o ouvinte para falar sobre as diferentes faces do amor. E faz isso de uma maneira vibrante, plural, desafiando padrões heteronormativos ainda associados à cena de forró no Brasil.

Lançado em meados de junho, Quem Mandou Chamar? marca a estreia de Jáder, também vocalista da banda Mulungu, em carreira solo. O álbum teve produção musical de Guilherme Assis e Barro

Inicialmente, o artista independente planejou músicas que bebiam do forró tradicional nordestino para a composição do repertório. Porém, o ouvido que virou fã do cantor Zé Vaqueiro, colocou a tradição na gaveta e levou a decisão de que o piseiro predominaria nas faixas. Tal predominância, ainda assim, não limitou Jáder, que inspirado no melhor que o estado tem para oferecer musicalmente, de Elba Ramalho à Musa do Calypso, consolidou um disco que emana o que ele mesmo chama de “música pop latina”, com forró, piseiro, brega e reggaeton.

 Na segunda faixa, “Lua Escorpião” anuncia a busca por uma paixão. A guitarra forte que acompanha o teclado sintético embala um refrão que tem tudo para ficar na cabeça, quando canta “Me beija / Me beija / Beija o meu corpo todo / Fode a minha cabeça.

Com potência e surpresa, a terceira faixa homônima é um dos muitos pontos altos que Jáder alcançou. Os primeiros segundos já trazem o interlúdio “BUTANO PRA DESCER”, que é nada menos que um áudio enviado pelo emblemático Riquelme na Batera, avisando que a “virada” que vai fazer em um trecho será potente. E assim acontece na faixa que assume: “Peito bateu mais do que a virada de Riquelme“, e é responsável pela participação mais inesperada e bem construída da sequência. A bateria de luxo divide o protagonismo com a voz de Jáder, e fica muito difícil não achar semelhança com o forró eletrônico do Aviões do Forró, ainda assim sobressaindo o estilo único, versando sobre o desejo. 

“Emoji de Beijo” dá continuidade, começando com uma sanfona manhosa, junto de um triângulo e a impressão de uma zabumba, que faz crer na chegada de um segmento mais tradicional, lembrando um xote Gonzagueano. A primeira estrofe cantada por Jáder muda os ares, trazendo uma guitarra, que moderniza a faixa e torna o xote mais pop. Aqui, um ser culpado lamenta pela perda de seu amor, e declarações e convites serão feitos por mais uma chance. “Eu Gosto” chega provando na letra e videoclipe para mostrar que, até quem é desapegado, gosta de uns dengos, uns apertos e pode ceder às paixões. A faixa apresenta uma linha tênue (se existir) entre o forró e o piseiro. A sensação do primeiro estilo em sua forma mais tradicional aparece pela sanfona constante e pelo coro feminino que acompanha o refrão, não tirando o espaço dos elementos eletrônicos tão característicos do segundo estilo presente.

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Sofrência, brega pra dançar colado, jogação pop: coube tudo no balaio de Jáder. (Foto: UHGO/Divulgação.)

“Falso Encanto” vem na sequência para tirar o fôlego. Nos primeiros momentos de sua reprodução, o toque de um brega raiz é explorado. A sensação que dá é a de que o Conde Só Brega vai cantar a qualquer momento, mas Jáder e a artista pernambucana UANA dão conta do recado nesta parceria. A letra melancólica, digna de término, é embalada por uma composição instrumental (destaque ao saxofone) envolvente e dramática como um bom brega entrega, alcançando o poder de satisfazer quem está ouvindo e levantar casais para dançar colado.

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A seguir, “Pele com Pele” namora o reggaeton, com guitarra suave e constante, esbanjando sensualidade assim como a letra, que escancara o desejo e declara Por favor não me impede / Eu vou gritar até eu ficar rouca. Logo após, “Se Lascou” volta com o piseiro em destaque. Quem se lasca neste caso é o peito de Jáder, que no videoclipe e letra lamenta o término de uma paixão fulminante. A seguir, “Larga Esse Boy”, que também é presente no repertório do álbum Orgia de Johnny Hooker, reforça a parceria com um piseiro eletrizante e letra pegajosa, daquelas que se espera o refrão para cantar com força. A faixa compartilhada se encaixa bem na proposta do álbum de Jáder, ao falar sobre um amor que abala o mundo, mas já pertence a outro alguém.

“Te Dar” fecha o álbum com chave mais que dourada. Quem começa aqui é a sanfona num ritmo típico do forró pé-de-serra acompanhada de um coro que repete parte do refrão. Assim que Jáder começa a cantar, a veia pop é carregada e o eletrônico incorpora o instrumental que é cheio de nuances. Não satisfeitos pela mistura inesperada, a parceria com a artista pernambucana Jéssica Caitano se concretiza com uma embolada quase que de supetão, na voz forte da cantora.

O primeiro passo nesta nova fase de Jáder em carreira solo se revela assertivo e ousado. A releitura do forró e piseiro feita pelo artista independente e LGBTQIA+ é um investimento de coragem e protesto. Com Quem Mandou Chamar?? Jáder decide falar de seus prazeres e desejos, furando a bolha do protagonismo do homem “másculo” e hétero que ainda predomina na cena musical de gêneros como o forró. A versatilidade, a exaltação da regionalidade, e a quebra de paradigmas premiam Jáder no pontapé inicial de uma carreira promissora e expressiva na música pop brasileira.

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