Por Paulo Floro
Da Revista O Grito!, em Belo Horizonte
O Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ) é hoje a maior vitrine para um autor de HQs no Brasil. Com cerca de 400 quadrinistas disputando atenção do público que frequenta o pavilhão da Serraria Souza Pinto em Belo Horizonte, o evento ganhou relevância dentro do atual mercado brasileiro. Mas esse panorama poderia ser bem melhor, caso as grandes e médias editoras prestassem atenção na produção que circula pelo festival.
“As editoras precisam tirar a porra da bunda da cadeira”, disse o editor da Maurício de Sousa Produções, Sidney Gusman, durante o primeiro painel do FIQ sobre mercado atual no Brasil. Segundo ele, as grandes editoras não prestam atenção nos autores que participam do FIQ, a grande maioria com qualidade suficiente para emplacar projetos de álbuns de HQs. “Cadê a Companhia das Letras? A Panini veio aqui apenas para vender assinaturas. Tá errado. Há dois anos fui parado por um representante de editora, mas era um gringo”, disse. O coordenador de quadrinhos da Fundação de Cultura da Prefeitura de Belo Horizonte, que organiza o FIQ, Afonso Andrade disse que o mercado vem mudando. Prova disso são as rodadas de negócios que acontecem entre autores e publishers, em um encontro formal para avaliação de projetos e portfolios, intermediado pelo Sebrae. “Demorou ‘apenas’ 16 anos para isso acontecer. Mas ainda é pouco. Eles deveriam estar caçando os quadrinistas”.
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Sidney é um dos responsáveis por dar holofotes para os talentos surgidos no meio independente dos quadrinhos. Com as antologias de homenagem aos 50 anos de Maurício, ele revelou diversos nomes do cenário indie. Os três livros MSP – Maurício de Sousa por 50 artistas servem hoje como uma espécie de enciclopédia não-oficial do quadrinho autoral nacional. Com os álbuns criado com personagens da Turma da Mônica, chamados de Graphics MSP, Gusman mostrou que o mercado brasileiro tem potencial para HQ autorais voltados para público de massa. Até então, acreditava-se que as grandes tiragens estavam restritas ao público infantil. A primeira revista da série Astronauta – Magnetar, feita por Danilo Beyruth, esgotou três reimpressões e hoje já está à venda na França.
Das grandes editoras que trabalham com quadrinhos no Brasil apenas a Leya e a Nemo marcaram presença no FIQ. O quadrinista Jal, um dos criadores do prêmio HQ Mix, disse que existe hoje uma acomodação dos editores quando o assunto é lançar novos autores. “Todos estão acomodados, sem querer arriscar, o que é péssimo para o mercado. Nenhum editor que arriscar o seu salário para lançar um novo nome dos quadrinhos.”
O efeito Maurício
Para Sidney Gusman existem hoje no Brasil dois mercados de quadrinhos: um é Maurício de Sousa, e outro são os demais. As revistas da Turma da Mônica são campeões de venda no Brasil e conseguem bater títulos estrangeiros, a exemplo de Turma da Mônica Jovem, hoje a HQ mais vendida do Ocidente. Foi com essa revista que o criador da turminha conseguiu atrair um público que até então tinha se afastado dos gibis de Cebolinha, Mônica e cia, os adolescentes.
Foi para esse público teen que Maurício de Sousa soube dar apelo ao trazer um traço inspirado no mangá, histórias com continuações e relações amorosas – Mônica e Cebolinha enfim engatam um romance. Um passo natural foi encontrado por Gusman ao criar as séries de graphic novels que hoje atendem a público mais adulto e consumidor de quadrinhos autorais. Esse crescimento de Maurício de Sousa em diversas trincheiras do consumo de gibis beneficiou todo o mercado, segundo Jal.
“Há pessoas que reclamam dizendo que o sucesso de revistas como Magnetar e outros álbuns aconteceu apenas por que estão ligados ao nome de Maurício de Sousa. Temos que parar de depreciar o que é nosso. Um desenhista brasileiro conseguiu manter mercado batendo Disney e outros nomes, agora temos é que aproveitar”, disse. “Os autores e editoras brasileiras precisam aproveitar esse público que estava longe das HQs há muito tempo e que retornaram por causa da Turma da Mônica”, explica Gusman.
Dona da loja Itiban, em Curitiba, uma das mais tradicionais quando o assunto é quadrinhos no Brasil, Mitie Taketani lembrou que poderia ficar rica vendendo somente mangá e super-herói. Mas prefere apostar em nomes autorais brasileiros. “O problema é que as editoras precisam melhorar suas relações com público e distribuidor para fazer com que as obras cheguem ao leitor. O mercado brasileiro vem crescendo, mas é preciso mais interesse para fazer essa produção circular”.