A segunda-feira (04), o quarto dia de de exibições do Festival Janela Internacional de Cinema foi especialmente proveitoso para quem tem um olhar atento aos títulos recentes do Cinema nacional independente. Centro Ilusão, Dormir de Olhos Abertos e Kasa Branca já haviam passado por outros festivais e fizeram sucesso principalmente pelas escolhas não convencionais na forma de contar suas narrativas.
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Centro Ilusão, de Pedro Diógenes
O cineasta cearense Pedro Diógenes tem uma carreira extensa no audiovisual e, com Centro Ilusão, já está no seu nono longa-metragem, e entre suas produções mais recentes estão Inferninho (2018) – que ganhou o prêmio de melhor filme na edição de 2018 do Janela de Cinema – e A Filha do Palhaço (2022).
Centro Ilusão estreou em outubro deste ano no Festival do Rio e representa uma cena musical específica de Fortaleza ligada ao rock alternativo. O filme, inclusive, é protagonizado por dois artistas ligados a este circuito e que não tinham grande proximidade com a atuação: Fernando Catatau, guitarrista de 30 anos de carreira e fundador do grupo Cidadão Instigado, que estreou como ator nesse filme e Brunu Kunk, que é multi-instrumentista e produtor cultural.
Para olhos estrangeiros à cena musical de Fortaleza, alguns detalhes mostrados ao longo do filme certamente passaram despercebidos, mas é possível entender que a visão Diógenes quis ser panorâmica de certa forma, incluindo no filme tanto os nomes precursores, como é o caso do próprio Catatau, até artistas recentes como Mateus Fazeno Rock.
“Esse filme aqui, com certeza, nasce muito da minha paixão pela música cearense, por determinado tipo de música cearense […] e também nasceu em um momento muito pessoal, quando eu estava com um filme pronto e nessa coisa de mandar para festival e só recebendo “não”, e quando se está nessa situação você começa a se perguntar se o que você faz vale a pena e que caminho foi esse que você escolheu, e aí quando eu estava nessa crise comecei a escrever o roteiro. Junto disso também a minha vontade de fazer um musical, mas um musical que fosse quase o oposto do tradicional, com com direto, sem muito equipamento, sem coreografia”, contou o cineasta quando perguntado no debate sobre os gatilhos que inspiraram esse novo filme.
“Eu tenho olhado para esse filme, hoje, depois de algumas sessões, com um olhar de naturalidade, e mergulho na etimologia dessa palavra mesmo, porque, nesse filme, existem pessoas que são naturais do mesmo lugar e essas pessoas estão concentradas neste lugar e ligadas ao som natural dele. E também uso essa palavra no sentido de ser contra o artificial, porque é tipo o que Pedro falou, não um musica cheio de firulas, planejado, hollywoodiano, não é. É um cinema sincero, poético e com muito som”, complementou Brunu.
Dormir de Olhos Abertos, de Nele Wholatz
Com atraso, a segunda sessão do dia foi de Dormir de Olhos Abertos, segundo longa metragem da diretora alemã Nele Wholatz. O filme é resultado de uma colaboração entre Brasil, Taiwan, Alemanha e Argentina, e tem Kleber Mendonça Filho, Emilie Lesclaux e Doram Amorim dentro de sua equipe de produção.
Dormir de Olhos Abertos é o segundo longa-metragem de Wholatz que fala sobre experiências de imigrantes – o primeiro foi O Futuro Brilhante, de 2016. Nesta segunda produção, a cineasta representa as experiências de imigrantes chineses que vêm trabalhar no comércio do Centro da cidade, no Bairro de São José, com referências às investigações de 2013, que descobriram um esquema de monopolização do comércio de importados, tentativa de assassinato e mão de obra análoga à escravidão.
O filme ficcionaliza histórias de membros da comunidade chinesa local e os representa através das personagens. “Tive a sorte de ter uma aliada chinesa, que é Xiaobin Zhang, atriz do meu primeiro filme. Viajamos juntas para Recife para fazer essa pesquisa, por que eu sabia que precisava de uma tradutora, e ela é da mesma região que os chineses daqui de Recife, e a partir disso fizemos conversas muito longas [com os imigrantes]”, contou Wholatz à Revista O Grito!.
Apesar de explorar aspectos diversos da experiencia de ser um migrante, a linguagem recebe certo protagonismo no filme, que as vezes chega a ter diálogos com falas em chinês, português e espanhol de uma vez só. Sobre a experiencia de trabalhar em uma produção com tantas línguas, a diretora contou que foi um “processo coletivo, onde havia muitas instâncias de tradução”, com tradutores integrados à equipe durante os diálogos na execução. “As vezes me perguntavam ‘Nele, esta frase, podemos dizer desta maneira?’ […] e acabou ficando fora do meu controle, então tive que soltá-lo e acabar confiando no senso de coletividade”.
“Estou muito ansiosa, mas muito feliz. É uma sala maravilhosa e é muito lindo poder compartilhar com a equipe, muita emoção. É como trazer o filme para um lugar que também é um pouco minha casa”, afirma a cineasta à Revista O Grito! sobre a experiência de exibir o filme no Recife.