Eternidade
David Greyne
EUA, 2025. Comédia/Drama. Distribuição: A24
Com Elizabeth Olsen, Miles Teller e Callum Turner
Nascido na Irlanda, o diretor David Greyne produziu talvez uma das comédias românticas com maior DNA estadunidense do ano. Assim como Celine Song representou o modus operandi capitalista em Amores Materialistas, Greyne curiosamente concebe o pós-vida em Eternidade (2025) a partir de uma dinâmica mercadológica: lá “do outro lado”, quem morre precisa escolher, no prazo de uma semana, o mundo no qual deseja passar toda a eternidade, numa espécie de convenção de negócios. A grande feira oferece inúmeros mundos para os recém-mortos, mas a regra é clara: uma vez optando por determinada eternidade, você não pode voltar atrás.
Outro interessante elemento do roteiro: no Além, as pessoas tomam a forma corporal referente à idade na qual foram mais felizes (por isso existirem poucos adolescentes por lá, explica certa personagem). O fator juventude ajuda a desencadear o dilema que assola Joan (Elizabeth Olsen); a moça se vê confrontada a escolher entre Larry (Miles Teller), o homem com quem passou a vida, ou Luke (Callum Turner), seu primeiro e ardente amor que morreu na Guerra da Coreia e a esperou por décadas. Imbróglio posto, o filme é eficiente na construção de cenas cômicas e ansiogênicas, capazes de fazer o espectador se perguntar o que faria se estivesse no lugar dos personagens. Através da carismática Anna (Da’Vine Joy Randolph, com seu timing cômico impecável), a Coordenadora do Pós-Vida de Larry, a narrativa consegue explicar as regras daquele universo de forma orgânica, sem soar excessivamente expositiva.
Para uma produção da A24 e com tamanha proposta fantasiosa, Eternidade finca os pés no chão até demais. O desenvolvimento do enredo se abraça a fórmulas convencionais e, pior, tematicamente conservadoras. Em momentos-chave da história, são os personagens masculinos os responsáveis por destravar nós emocionais que atordoavam a mente dividida de Joan. Mesmo com o discurso superficialmente progressista, o roteiro demonstra que, sem o aval dos homens, dificilmente a protagonista tomaria as decisões mais importantes da trama. Tão adstrito aos dramas do amor romântico, o filme ignora por completo outros laços familiares, como a relação de Joan e Larry com os filhos ou os netos (vistos como meros acessórios pontualmente lembrados pela narrativa).
Agrada-me a composição cênica do filme; a direção de arte utiliza-se de elementos que evocam uma atmosfera teatral, artesanal, como os tecidos nas janelas para representar a ideia de dia e noite, além das bonitas sequências no “túnel das memórias”, nas quais o conceito de encenação das próprias vidas é evidenciado. Mecanismos narrativos que poderiam ser mais explorados pela direção de David Greyne; entretanto, o cineasta prefere focar no sentimentalismo receitado por incontáveis filmes anteriores, mais palatável aos moldes do cinema comercial norte-americano. A produção parece se limitar a apostar na química do trio de atores principais. Elizabeth Olsen e Callum Turner transmitem segurança e carisma aos seus papéis, enquanto Miles Teller se destaca ao construir o mais cômico dos três personagens, imprimindo os sutis trejeitos de um senhor de idade avançada.
Lançado nos Estados Unidos no tradicional feriado de Ação de Graças, Eternidade chega ao Brasil nesta primeira semana de dezembro, janela importante para atrair o público próximo às festas/férias de final de ano. Banhado pela água com açúcar das comédias românticas, o filme provoca boas reflexões e risadas, principalmente na primeira metade da projeção. Sem tanta inspiração, segundo e terceiro atos propendem a soluções apressadas que põem em xeque os próprios regulamentos propostos pelo roteiro. Não há como afastar o dissabor.
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