Zeca Viana, baterista da Volver chamou atenção da cena independente ao lançar seu projeto solo ano passado durante o No Ar: Coquetel Molotov e, antes, na coletânea virtual O Grito! Ano Um, lançado pela Revista O Grito! em junho. Agora, com o lançamento de seu primeiro disco, Seres Invisíveis, ele e sua banda Onomatopeia Bum se preparam para ganhar mais destaque no resto do país.
O Grito! bateu um papo com Zeca, que falou, entre outras coisas sobre a escolha do repertório, das roupas e das performances no palco. De quebra, ainda contou a história de Doutor Ervilha, personagem-título de sua música mais conhecida. E sim, ele existe.
Por Paulo Floro
DEPOIS DO SUCESSO E PRESTÍGIO QUE O VOLVER CONSEGUIU NO CENÁRIO NACIONAL, VOCÊ ESPERAVA ESTA REPERCUSSÃO COM SEU PROJETO SOLO?
Rapaz, não esperava não. Acho que tivemos sorte, as coisas aconteceram na hora certa. Conseguimos uma boa repercussão nacional depois da apresentação no festival Coquetel Molotov. O pessoal do Coquetel apostou na gente e ficamos felizes de saber que o resultado foi positivo. Sempre escrevi canções, sempre quis que minha música fosse respeitada em Pernambuco e hoje sendo chamado para tocar em outros estados é uma grande satisfação.
QUAL O ENVOLVIMENTO COM A ONOMATOPEIA BUM? FICA TUDO MAIS LÚDICO COM AS IRMÃS EGITO E O DOMINGOS (MONODECKS).
É verdade. Também aconteceu naturalmente. No processo de gravação dos Seres Invisíveis, Maíra e Sofia gravaram algumas faixas. Passamos muito tempo juntos. Na minha primeira apresentação lá na Saraiva elas participaram já como “Onomatopéia Bum!”, que é um nome que Maíra tinha na cabeça desde criança. Assim a gente acabou criando músicas novas em casa como foi o caso de “Late, Leite Light!”, “You and I”. Acho que ali nasceu mesmo o Zeca Viana & Onomatopéia Bum! Já Domingos é um cara que tem uma grande intuição musical e o Monodecks pra mim é uma das melhores bandas do circuito independente.
QUANDO SURGIU A IDEIA DE CRIAR O PROJETO?
Acho que foi em alguma tarde lá pelos anos 80, eu era criança ainda. Desde uns 5 anos eu queria ter uma banda de rock, ficava lá tocando pianinho, tocando bateria no sofá. Desde criança gosto de inventar músicas pra ficar perturbando os outros ou apenas cantando dentro da cabeça, imaginando uns filmes fantasmagóricos. No metrô, na sala de espera de dentista, eu gostava de brincar de compor. Eu lembro uma vez quando eu era 3ª série, eu olhando pro teto da sala, parecia a superfície da lua, as melodias, os sons, estavam todos lá.
SERES INVISÍVEIS SEGUE O MESMO CONCEITO DOS SHOWS? O DISCO CONTA ALGUMA HISTÓRIA?
Na verdade esse disco é tão pessoal que acaba contando a minha história, como se fosse um diário ou algo assim. É como se fosse uma coletânea das minhas memórias. Lembranças da minha infância, de cola colorida secando no dedo, de assistir tevê com meu pai, de experiências lisérgicas, de sonhos, de amoresfarras… É uma coletânea do que eu sou.
QUE UNIVERSO DE REFERÊNCIAS INSPIROU SERES INVISÍVEIS. SABEMOS DE SUA INFLUÊNCIA PSICODÉLICA, MAS O QUE MAIS SE ESCONDE NO ÁLBUM?
Escuto tanta coisa diferente nesse sentido que fica meio difícil definir. Mas acho que tem muito de Mutantes, de desenhos animados, de estudos sobre Metafísica, B-52´s, de grunge, de anos 80… São muitos pedaços meus que ficaram gravados no disco. Muitas melodias escondidas. Foi tudo fluindo, escoando. Daí também o nome do disco ser Seres Invisíveis. São os vários “eus” que se mostram, são as minhas lembranças transformadas em frequência, são as pessoas e as coisas que não participam mais do mundo material, mas que se manifestam em forma de melodia. São outros seres que não são eu. Eu me sinto feliz em tê-los transformado em canções.
UMA DAS CARACTERÍSTICAS DA BANDA É SER PERFORMÁTICA. QUEM PENSA OS FIGURINOS, A MARCAÇÃO E OS TREJEITOS NO PALCO?
Escolhemos nossas melhores roupas de ir no médico e vamos pro palco! (risos) Brincadeira, na verdade as meninas se empenham mais nessa parte. O ideal para a banda seria a estrutura que o Coquetel Molotov proporcionou. Telão, luzes baixinhas, som de qualidade… Se sempre fosse assim seria fantástico, mas às vezes não dá. Os figurinos no Coquetel foram assinados pela [grife pernambucana] Meketref, mas normalmente pegamos roupas nossas, roupas de carnaval são perfeitas, tudo com um tom mais lúdico.
JÁ TEM PLANOS PARA O DISCO, ALÉM DO LANÇAMENTO VIRTUAL? E SHOWS FORA DO RECIFE?
Acabei de chegar do Grito Rock de Fortaleza. O Onomatopéia não pode me acompanhar então fiz um show baseado no Seres Invisíveis e a recepção foi acima da esperada. Adorei tocar lá e já fui chamado para voltar em Março. Estaremos em João Pessoa dia 14/2 e estamos fechando Natal provavelmente para Março também. Para o lançamento do Seres Invisíveis tô pensando em fazer alguma coisa na Livraria Cultura. Queria fazer com calma pra que tudo corra bem certinho. Vou chamar a Onomatopéia, D Mingus e provavelmente mais alguns convidados.
OS FÃS DO VOLVER GOSTAM DO ZECA VIANA SOLO? JÁ RECEBEU ALGUM FEEDBACK?
Os fãs da banda sabem que na verdade esse projeto só vem para acrescentar ao Volver. Adoro tocar bateria, não quero deixar de fazer isso. O exercício de compor fez inclusive com que “Coração Atonal” entrasse para o Acima da Chuva [último disco da Volver]. Abrem novas possibilidades. Por exemplo, eu e Bruno [Souto Maior, vocalista] já fizemos três músicas em parceria para o próximo disco do Volver. Todos da banda me apoiam e isso é o que faz com que sejamos fortes juntos. E digo logo que Bruno tem algumas surpresas para esse ano.
O VOLVER ESTÁ NESSE MOMENTO TENDO BOM RETORNO DE MÍDIA E DESPONTANDO NO CENÁRIO NACIONAL. AO MESMO TEMPO, VOCÊ LANÇA UM PROJETO SOLO. COMO CONCILIAR?
O projeto solo é uma necessidade mesmo. Sou muito agitado criativamente e tenho que concretizar minhas ideias, tenho que torná-las reais. Nesse projeto solo eu posso tocar todas as músicas somente com voz e violão e ainda também ter a participação do Onomatopéia Bum! Não é difícil conciliar, é só organizar direitinho as datas e fica tudo tranquilo.
TEM ACOMPANHADO A CENA INDEPENDENTE NACIONAL? SEU PROJETO SOLO, ASSIM COMO OUTRAS BANDAS, CONSEGUIRAM UM ESPAÇO SE LANÇANDO QUASE QUE EXCLUSIVAMENTE ONLINE.
É verdade, a facilidade de fazer tudo virtualmente facilita um bocado as coisas. Inclusive a coletânea O Grito! Ano Um foi muito importante pra mim nesse sentido. Ela tocou um bocado pelo Brasil afora em rádios, rádios on line, blogs. A coletânea dos artistas que participaram do Festival Coquetel Molotov também. Foi parar lá fora, na gringa. Isso é ótimo. Espero poder lançar a versão física do Seres Invisíveis em breve. Eu sou daqueles que também gosta de ter o disquinho e ouvir em casa.
INTERESSANTE O MODO COMO O PROJETO CONGREGA OUTRAS MANIFESTAÇÕES DE ARTE, COMO ILUSTRAÇÕES E VIDEOARTE. QUEM PENSA OU IDEALIZA ISSO E COMO SURGEM AS IDEIAS?
Seria ótimo fazer tudo ao mesmo tempo: músicas, com videoarte, de repente alguém pintando no palco, alguma performance, uma instalação no palco, uma mostra com ilustrações. Maíra também é ilustradora. Seria uma bagunça genial!
“DOUTOR ERVILHA” ME PARECE MUITO TRISTE, À PRIMEIRA VISTA. DÁ A IMPRESSÃO QUE ELE JÁ MORREU. TEM ALGUMA HISTÓRIA SOBRE A MÚSICA? ELA TAMBÉM É UMA DAS MAIS FAMOSAS DE VOCÊS, CERTO?
Ele é um personagem real, mora atrás da minha rua. Ele ainda está vivo e continua andando pelas ruas da Estância vestido como se fosse jogar futebol de salão. Ele era professor de física, mas ficou maluco depois de uma história de amor mal acabada. Mas ele é uma figura divertida no final das contas. Está sempre dançando ou falando sozinho.
GOSTA DESSA PECHA DE BANDA EXPERIMENTAL?
Acho que é positiva na medida em que existe a liberdade para experimentar sempre. Gosto muito de música, então se um dia eu quiser gravar um Xote ou um House ainda posso me chamar de experimental. Música pop, Mutantes, John Cage, tudo isso se mistura pra mim. Mas não sou muito de usar notas difíceis, gosto mais do feijão com arroz bem temperado.
PLANOS PARA O FUTURO PRA DAQUI A POUCO? E PRA LONGE?
Quero continuar gravando, compondo, fazendo shows. Quero tocar muito com o Volver, com o projeto solo também, viajar… Quero gravar um disco com o Onomatopéia Bum! Quero gravar outro disco solo. E no mais amor, paz e saúde para todos nós que nunca é demais. Um abraço para todos e salve a música!