NOVOS ARES DA VOLVER
Banda pernambucana comenta novo disco e diz que falta interesse dos recifenses pela própria música feita no Estado
Por André Mantra
Cerca de um ano depois de sair do Recife para fixar base em São Paulo, os pernambucanos do Volver retornam à cidade para o lançamento do novo álbum, Próxima Estação. Considerado o trabalho mais maduro da banda, traz composições que se aproximam da MPB e falam de relacionamentos, mudanças e saudade da terra natal. “A mudança não foi apenas geográfica, mas também de percepções, de influências musicais das mais diversas, de experiência mesmo”, disse Bruno Souto, em entrevista para a Revista O Grito!.
Um dos nomes mais importantes da cena independente na primeira metade dos anos 2000, o Volver sempre trabalhou em uma estética influenciada pelos anos 1960 e da Jovem Guarda. Esteve longe das referências regionais que algumas bandas recifenses adotavam na época de seu surgimento, em 2003. Neste disco, eles decidiram tirar onda com “Mangue Beatle”, faixa que causou muita repercussão – e críticas negativas à banda (veja abaixo). “Sabíamos que a canção geraria polêmica, afinal, nem todos sabem interpretar as coisas de maneira equilibrada, e muitos não possuem senso de humor”, diz Souto.
Na entrevista abaixo, a banda fala do processo de mudança para São Paulo, o amadurecimento que chega com este novo trabalho, entre outros assuntos. O show acontece dentro do festival Fort Rock Fest neste sábado (16) e traz ainda shows do Supersoniques e River Raid. Os ingressos custam R$ 25. Veja a íntegra da conversa.
A Volver irá realizar mais um show no Recife, desta vez para lançar o Próxima Estação ao lado das bandas das também pernambucanas, Supersoniques e The River Raid, bandas formadas ainda nos anos 90 e numa locação inédita para muitas bandas. Qual a expectativa de vocês?
Estamos muito animados em poder lançar o Próxima Estação em Recife. Vários fatores contribuem: saudade (faz mais de um ano que tocamos pela última vez na capital); tocar no Forte do Brum, que é um lugar lindo; apresentar a nova formação (com três integrantes que nunca tocaram com a banda em Recife) e principalmente, poder apresentar ao vivo as novas músicas pro nosso público mais querido.
Próxima Estação é um álbum repletos de musas, saudades e despedidas nas temáticas, afinal que existe ou não, “amor em SP”?
Claro! São Paulo é difícil e dura sob vários aspectos, mas existe amor sim, às vezes nos lugares onde menos se espera, aliás. Tudo depende de como cada um traduz e sente a cidade.
“Mangue Beatle” é resultado de uma parceria musical (para o projeto musical The New Folks) com Tagore Suassuna, mas só ganhou força de execução e repercussão pela Volver, afinal é o single que puxa o novo trabalho. Vocês já imaginavam que a canção teria tanta repercussão?
Achávamos que receberíamos alguns jebs, mas recebemos um caminhão de cruzados! (Risos). Mas claro que sabíamos que a canção geraria polêmica, afinal, nem todos sabem interpretar as coisas de maneira equilibrada, e muitos não possuem senso de humor. Afora os que realmente couberam na carapuça, né? Muita gente se revelou. Mas não é pela opinião dos outros que deixaremos de fazer o que acreditamos. Eu poderia criar outra polêmica e dizer que “não existe humor em PE”, mas não é verdade. Recebemos muito mais palavras de incentivo e carinho que críticas, mas, os que se opõem sempre fazem mais barulho, não é mesmo? Como por exemplo, cometer o crime de invadir nosso site. Enfim, tá tudo certo. O recado foi dado.
Como pernambucanos residentes em São Paulo e que viajam pelo principais centros culturais do Brasil, como é vista e comentada a música pernambucana através das pessoas que lá vivem?
A música pernambucana é muito respeitada onde quer que a gente vá. Se um trabalho autoral consegue ter uma projeção para além das fronteiras pernambucanas, as pessoas que gostam de música, Brasil afora, sempre ficam curiosas. Se tivéssemos mais habilidade pra vender, incentivar e renovar nossa música como, por exemplo, os baianos fazem, potencializaríamos isso muito mais. Nossa diversidade e qualidade são insuperáveis. Não estou dizendo para necessariamente usarmos o modelo baiano, mas com certeza precisamos dar uma sacudida em todo o sistema. Parece-me que a música pernambucana se acomodou e se resignou no papel de “Cult” (o que não traduz, pra mim, o todo).
Na minha opinião, Recife tem potencial pra ser mainstream, mas, infelizmente não fazemos nem o dever de casa, pois não possuímos, por exemplo, sequer uma estação de rádio que priorize nossa produção autoral (nos mais diversos gêneros, e não apenas os regionais), o que consequentemente, criaria um interesse maior do público local, pelo menos. Como metáfora, a música pernambucana tá cheia de craques, mas na hora do jogo, dependemos de algum talento individual pra marcar um gol. A coisa não funciona em sua coletividade, como deveria. Como ouvi alguém dizer, ‘Recife é uma ficção, para o bem e para o mal’.
A música pernambucana tá cheia de craques, mas na hora do jogo, dependemos de algum talento individual pra marcar um gol
A faixa “Mallu” também não fica de fora de algumas suposições…
Uma homenagem…
Por outro lado, “Saudades de Um Verão” tem tudo para ser bastante compreendida e esperada pelos pernambucanos. Tanto para quem mora no estado e principalmente para pessoas que como vocês, moram longe. Falem a respeito dessa canção.
Essa surgiu das entranhas nos quarenta e cinco do segundo tempo. Foi a última música composta pro disco. A letra já é autoexplicativa. O que posso acrescentar é que, longe, me senti à vontade pra exaltar minha terra e exprimir minha saudade.
Próxima Estação está disponível em versão digital em parceria junto a Trama, os números (downloads) são animadores?
Pra falar a verdade, ainda não temos os números. Mas em termos de acessos, no “Album Virtual” da Trama, já passamos discos do Baden Powell, Macaco Bong, Elis, Nação Zumbi.
A quem se deve o amadurecimento das composições, arranjos e produção de Próxima Estação? Um álbum produzido no Recife e masterizado em Porto Alegre.
O que contribuiu muito foi nossa vinda pra cá. A mudança não foi apenas geográfica, mas também de percepções, de influências musicais das mais diversas, de experiência mesmo. E cada disco nosso foi um retrato do que éramos e como gostaríamos de nos expressar numa determinada época. Esse não foi diferente.
Mesmo tratando-se de um trabalho com referências (fortíssimas) roqueiras, harmonicamente está mais próximo a música brasileira, especialmente dos anos 70, muito além das letras e canto em português. Foi essa a intenção?
Nada na Volver é forçado. Esse processo de composições e arranjos sempre rolou muito naturalmente, sem analisar muito. É mais no sentimento. Se o resultado fica parecido com A ou B, pouco importa pra gente. Simplesmente flui dessa maneira.
The River Raid e Supersoniques são bandas (que estarão a dividir o Palco com a Volver neste dia 16) bem distintas, principalmente em relação ao modus operandi. Contudo, seguem ao longo dos anos. Como a Volver vislumbra a sua longevidade? ou seja, está cada vez mais possível (sobre)viver do seu próprio trabalho?
Por enquanto, a Volver é meu principal projeto de vida. Quem me conhece sabe o quanto isso é importante pra mim. Fazer canções e discos é o meu norte espiritual, minha necessidade básica. Por isso, vislumbro uma longa estrada pra banda, ainda que tenha que lançar alguma coisa solo ou outro projeto qualquer. Não se está mais possível viver de música hoje do que em 2003, quando surgiu a Volver. Sempre foi e ainda é muito complicado, mas hoje já temos uma carreira que nos orgulhamos e estamos sempre com fome de mais. Se isso algum dia se traduzir num conforto financeiro, ótimo. Se não, continuaremos a seguir em frente, como sempre.
A Volver lançou até aqui três álbuns, contudo, houve mudanças na formação da banda ao longo desses anos, o que pode-se destacar como positivo em relação a isso? E quais são até aqui, as principais virtudes dos atuais músicos/integrantes?
Um dos pontos positivos é que essa renovação sempre agrega muito na parte musical, com a bagagem de experiência e influências que cada um traz consigo. Kleber Croccia (guitarra) é o nosso mascote, piadista nonsense e meu braço direito dentro da banda. Nos arranjos, ele é muito de sentir, intuitivo. Não enxergo mais a banda sem ele. Thiago Nistal (bateria) foi um achado. Ele é paulistano e professor de bateria. Um cara que somou em todos os aspectos. Augusto Passos (baixo) é o caçula da banda. Moleque no melhor sentido da palavra. Mas apesar de novinho, é um músico de uma técnica bastante apurada. E o Missionário José (teclados) é nosso maestro. Produtor e músico de mão cheia. Chegou com uma enorme bagagem musical, que aos poucos, estamos absorvendo. Enfim, a escalação é essa. E tenha certeza: só jogamos pra ganhar.