OUTRO CAMINHO
Por Paulo Floro
Eles não resistem ao clichê e dizem fazer apenas o bom e velho rock, mas a banda paulistana Debate produz um som que incorpora elementos do jazz e pós-punk. Formado por Sérgio Ugeda (guitarra e voz), Marcelo Mandaji (baixo) e Richard P. Ribeiro (bateria), a banda começou em 2004, após o fim do grupo Diagonal e tem apenas um EP de seis faixas lançado.
Este ano o trio realizou sua segunda turnê internacional, com apresentações no CMJ, festival independente norte-americano que acontece em cidades da Costa Leste. Antes já tinham desbravado o mercado indie dos EUA com shows, aparição no South By Southwest e gravações com Steve Albini, em seu estúdio Electrical Audio, em Chicago. A banda gravou seu novo disco com o produtor J.Robbins, conhecido por seu trabalho junto às bandas Jawbox e Dismemberment Plan.
Na volta da banda ao Brasil, após o CMJ, o vocalista Sérgio Ugeda conversou com O GRITO!
[Nos EUA] não é tão incomum um completo estranho tirar uma nota de $20 após o seu show fazendo questão de te dar, pedindo para que voltemos logo à cidade dele e oferecendo sua casa para tomarmos um banho, ter uma noite razoável de sono
O GRITO! – Sabemos que a banda surgiu de uma outra, o Diagonal, mas o que podem contar sobre o início da formação do Debate?
SÉRGIO UGEDA – Não faz sentido para nós pensarmos que o Debate surgiu do Diagonal. À parte do fato de que as duas bandas possuem dois integrantes em comum em suas formações, são duas bandas completamente diferentes em suas abordagens musicais e métodos de composição. Eu entendo que as pessoas possam estabelecer uma relação entre as bandas, mas me parecem bem evidentes as diferenças entre uma e outra. Este foi inclusive o raciocínio que eu e o Richard tivemos ao começar a compor as músicas que se tornariam o repertório do Debate: procurar não repetir o que fizemos no Diagonal. Começamos a trabalhar em Setembro de 2004 e ficamos sozinhos dentro do estúdio por uns três meses para compor as músicas do primeiro EP.
As referências da banda são bem improváveis e cada músico traz uma influência. O que torna o som da banda coeso?
O esforço e respeito mútuo, assumido um processo de ensaio e composição às vezes incrivelmente natural e outras vezes extremamente doloroso. No final, tudo fica bem coeso para nós.
Vocês tocaram no festival Coquetel Molotov, em Recife? Foi a estréia da banda? Como foi a experiência?
A apresentação durante o Coquetel Molotov em Setembro do ano passado não foi a nossa estréia. O primeiro show do Debate foi no dia 5 de Maio de 2005 no Milo Garage em São Paulo e antes de viajarmos para Recife acredito que fizemos cerca de 20 shows. De qualquer modo, tivemos uma experiência fantástica tocando e uma receptividade muito boa do público pernambucano. Certamente voltaremos a tocar por lá assim que surgir um convite.
A história da Amplitude também tem a ver com a banda não?
Bem… Eu fundei a Amplitude e participei da formação do Debate em 2004. Como financiei a gravação dos discos, concordamos que seria lógico que eu articulasse o lançamento dos títulos. Fora isso, as duas atividades raramente se cruzam.
Acho que o sucesso de bandas independentes no exterior é possível. Existem diversos exemplos, às vezes não tão difundidos na mídia e, assim, não tão conhecidos por aqui
Como foi o CMJ 2007. Contem alguma história.
Foi muito interessante. Trata-se de um evento consagrado dentro da indústria norte-americana e o Debate não só teve o privilégio de ser selecionado para participar como também entrou como destaque na seleção de 10 bandas internacionais promovida pelo site Sonicbids em parceria com o próprio CMJ. Fora tudo isso, assistir um show como o do Meat Puppets logo antes de tocar certamente faz a diferença para fazer um show com uma cara feliz.
Como foi a recepção dos shows nos EUA? Conseguiram vender muitos discos?
Sim, correu tudo muito bem. Como as pessoas nos EUA de fato possuem uma cultura independente elas compreendem o valor do suporte e consumo de bandas como o Debate. Fora isso, não é tão incomum um completo estranho tirar uma nota de $20 após o seu show fazendo questão de te dar pedindo para que voltemos logo à cidade dele e oferecendo sua casa para tomarmos um banho, ter uma noite razoável de sono e seguir viagem no dia seguinte para começar tudo de novo. Tivemos também a feliz surpresa de sermos abordados diversas vezes antes dos shows por pessoas que já conheciam o Debate de algum modo e estavam lá realmente para nos ver tocar. Por fim, fomos também extremamente bem recepcionados pelo We Vs. The Shark, uma ótima banda de Athens, GA com quem tocamos juntos durante toda a turnê.
Assistir um show como o do Meat Puppets logo antes de tocar certamente faz a diferença
Como começou a articulação para tocar nos EUA? Qual a lembrança mais remota que vocês têm sobre isso?
Tudo começou quando a Amplitude foi convidada para produzir um showcase no SXSW. A partir daí foi uma questão de procurar pessoas nos EUA e encontrar meios de fazer tudo acontecer.
O que podemos esperar do novo disco? O primeiro EP já delimitava bem as principais idéias e referências da banda, mesmo num disco curto. O que nos espera no novo trabalho?
É novamente um disco curto, talvez até um pouco mais curto do que o primeiro EP. Tem sete faixas, uma delas já disponível na nossa página no MySpace. Agora no segundo espero que nossas idéias e referências estejam ainda mais claras e definidas de modo ainda melhor – não apenas por se tratar de um disco seguinte, mas também por termos tido a oportunidade de trabalhar com o J. Robbins, músico e produtor que nos inspirou profundamente.
Mixar e produzir em estúdios nos EUA deixa claro a intenção de conquistar o público no exterior, ou existe outro motivo?
Na verdade, conquistar público no exterior é muito mais uma necessidade em ordem de não depender exclusivamente do mercado brasileiro assumindo que por aqui a coisa não está fácil para ninguém.
O que acham do sucesso de bandas independentes brasileiras no exterior? O Brasil pode fazer parte do cenário alternativo mundial como acontece já em outros países como a Suécia, por exemplo?
Acho que o sucesso de bandas independentes no exterior é possível. Existem diversos exemplos, às vezes não tão difundidos na mídia e, assim, não tão conhecidos por aqui. Sobre o Brasil fazer parte do cenário alternativo mundial como a Suécia, eu acredito que não é possível. Infelizmente fazer o que o Debate fez custa muito caro e é óbvio que nem todas as bandas brasileiras têm condições para dispor do dinheiro necessário para pagar as passagens e assumir os custos de viagem. Uma banda Sueca vive uma realidade completamente diferente assim como qualquer pessoa na Suécia vive uma realidade diferente do que a enfrentada pelas pessoas no Brasil. No entanto, talvez causaria surpresa para algumas bandas brasileiras se descobrissem que com o mesmo dinheiro gasto para fazer um clipe elas poderiam fazer uma turnê inteira.
Vocês têm dificuldade para descrever o som da banda?
Não. Adoramos usar um velho clichê e dizer que apenas fazemos rock.
O som do grupo tem uma relação forte com o pós-punk e o indie-rock norte-americano, mas os integrantes da banda têm passagens por bandas do underground paulista. Como vocês se relacionam com a cena independente brasileira?
Nos articulamos tentando marcar shows em condições razoáveis. Infelizmente, nem sempre dá certo.
Quais as últimas descobertas musicais que fizeram? Alguma banda ou disco que surpreendeu vocês recentemente?
Tem uma banda chamada Low Red Land, de San Francisco. Tocamos com eles em Greensboro, Carolina do Norte (EUA) e foi ótimo.
Quais os planos mais básicos da banda para um futuro próximo?
Conseguir continuar tocando – e em frente.
RAIO X
Disco que nunca envelhece
Um disco virtual. De mais a mais, envelhecer faz bem para bons discos.
Melhor música que ouviu esse ano
“Peacebone”, Animal Collective
Lugar ideal pra tocar
Em casa.
Melhor show até o momento
Na última turnê, o que fizemos em um porão em New Brunswick, Nova Jérsei (EUA).
Último filme interessante que assistiu
“Ela é o Cara” – acho que era esse o título…
Melhor personagem de quadrinhos
Rufferto.
Banda para manter distância
G.G. Allin