Lindebergue Fernandes coloca modelos tristes na passarela para protestar
Da Revista O Grito!, de Fortaleza
O estilista cearense Lindebergue Fernandes chocou o público do Dragão Fashion Brasil nesta edição 2013 com um desfile bastante emotivo. Os modelos, homens e mulheres, entraram na passarela com um andar pesado, cabisbaixo. Todos simulavam um ar triste, com maquiagem de lágrimas negras. Bem diferente do carão e andar que mais parece um trote que costumamos ver, ou ainda a caminhada robótica de algumas marcas. Lindebergue queria protestar.
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As roupas mostravam a caveira estilizada inspirada no Dia dos Mortos mexicano, marca registrada do estilista e traziam ainda um regionalismo pop, com uso de materiais locais. “Todas as modelos estão tristes por vários motivos”, explicou Lindebergue um dia depois, por telefone. “Quis fazer uma crítica ao atual momento da moda, que perdeu a paixão, o sentimento. As semanas de moda hoje estão muito voltadas para o chamado fast-fashion”, contou. “A morte de Clô Orozco [criadora das marcas Hui Clos e Maria Garcia, morta no mês passado] também me abalou”.
O artista é hoje um dos nomes mais importantes da moda autoral brasileira. Por seus desfiles conceituais, tem sido comparado a Ronaldo Fraga (“antes me incomodava a comparação, hoje até gosto”, diz). Trabalha há 15 anos como estilista e desfila na Dragão Fashion há mais de 10. Assim como outros nomes que vimos nesta edição, Lindebergue olha a moda como uma expressão artística, bem longe do puro consumo do varejo. “As pessas não querem ver as roupas que elas veriam no shopping. Querem ver sentimento do criador, aquilo que não pode usar. Quer um show”.
Um dia antes, encontrei o artista na primeira fila dos desfiles. Ele é baixinho, usa grossos óculos e tem um visual nerd-sertanejo. Fala com voz mansa, bem delicada. Seu protesto nesta edição do Dragão não foi pontual. Nos últimos anos, ele vem militando em uma moda sustantável e que envolva os artistas tradicionais da região. Foi um dos responsáveis pelo projeto de “Conexão Solidária” que viajou pelo Nordeste por dois meses em busca de técnicas de artesanato, em 2011. Esteve em Natal, São Luís, cidades de Sergipe e Maranguape, no Ceará. “Meu trabalho mostra um artesanato mais contemporâneo, menos folclórico”.
A noiva de burca
Voltando ao desfile deste ano no Dragão Fashion Brasil, o desfile de Lindebergue guardava ainda mais uma surpresa. Ao final, uma modelo surgiu na passarela usando um vestido de noiva como uma burca. “Meu protesto criticou a moda atual do Brasil, que perdeu sua identidade, mas também falava das pessoas amarem sem ter medo, se libertarem. Foi esta a ideia da burca”, explicou Lindebergue.
Sobrou até para Marco Feliciano. Estilista e equipe técnica entraram na passarela para agradecer com uma camisa escrito “Sua ignorância não me representa”. “A moda pode ser um espaço rico como espaço de arte, e não só vitrine de vender roupa”.
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