Desde que leu Cannabis, a Ilegalização da Maconha nos Estados Unidos, famosa HQ de Box Brown, o cartunista Daniel Paiva começou a imaginar como seria um quadrinho sobre a história brasileira da proibição da planta. O resultado disso é Diamba: Histórias do Proibicionismo no Brasil, livro que ele lança nesta quinta-feira, feriado do Sete de Setembro, durante a programação da Bienal de Quadrinhos de Curitiba.
“Quando eu li o Cannabis, essa ideia [de uma versão brasileira] rondava para mim e eu pensava como ia ser legal se alguém fizesse, mas não me imaginava fazendo isso”, contou Daniel em entrevista à Revista O Grito!. “Eu não sabia se eu seria capaz de produzir isso, porque eu tinha feito só tirinhas de três quadros com dois personagens conversando. Era um projeto muito grande para o que eu já tinha feito.”
Em seu trabalho, o autor costuma abordar o universo da Cannabis através de tirinhas que exploram de forma bem-humorada aspectos comportamentais do cotidiano do maconheiro. Em 2020, durante a pandemia, ele reuniu tudo na coletânea Beto e Dé e outros Quadrinhos Canábicos. Mas agora, na nova HQ que sai pela Brasa Editora, ele se afasta do humor e faz sua estreia na narrativa autoral mais longa.
A obra passeia por diferentes fatos históricos: desde os primeiros registros do uso da maconha na China Antiga, passando pela escravidão nas Américas, até chegar ao proibicionismo e à Guerra às Drogas nos dias de hoje. Os diferentes episódios têm como fio condutor a história de um jovem negro, morador da periferia, que é preso por usar um boné com a folha da Cannabis estampada.
“É interessante notar como o racismo e a xenofobia estão ali e como essa Guerra às Drogas é usada como pretexto para reprimir uma parte da sociedade que, não é coincidência, é a mais pobre.”
Daniel Paiva
“E essa história, que seria uma história fictícia, na verdade, foi inspirada em notícias de jornal”, explicou. “Mas além desse lado mais bibliográfico, o livro também é muito influenciado por músicas”, detalhou ele, que se utiliza de letras do sambista Bezerra da Silva e de bandas como O Rappa e Planet Hemp para contar a dura que o seu personagem principal leva da polícia.
Por meio de uma narrativa descontínua, Diamba traz ainda flashbacks de diversos episódios ocorridos por conta do proibicionismo no país, como as prisões de Gilberto Gil, de Rita Lee e do próprio Planet Hemp. Também está lá o caso de Francisco Benedito de Souza, julgamento que voltou a estar no centro das discussões do Supremo Tribunal Federal, o STF, e pode levar à descriminalização do porte de maconha para uso pessoal.
“Fui fazendo uma linha do tempo não apenas com a história jurídica, mas também pescando vários episódios, porque eu queria fazer um grande almanaque de casos canábicos ou casos que têm a ver com a proibição”, revelou. A intenção, segundo ele, é provocar reflexões sobre as consequências da criminalização. “Então, eu quis juntar vários casos. Não só essa história mais oficial das leis, mas também histórias pontuais e individuais para mostrar o que aconteceu com alguém de verdade, alguém que está aqui do lado.”
O quadrinho resgata ainda o surreal Verão da Lata, em 1987, quando tripulantes de um navio derramaram 22 toneladas de maconha no mar e as latas com a erva começaram a aparecer por quase todo o litoral brasileiro, bem como o Verão do Apito, em 1996, quando os banhistas do Posto 9, em Ipanema, usaram apitos para avisar aos fumantes que a polícia estava se aproximando.
“Então, é uma grande coletânea de casos absurdos e muitas vezes violentos, porque é assim que a nossa história é marcada”, lamentou Daniel Paiva. “É interessante notar como o racismo e a xenofobia estão ali e como essa Guerra às Drogas é usada como pretexto para reprimir uma parte da sociedade que, não é coincidência, é a mais pobre.”
Lançamento de Diamba
Em pré-venda no site da Brasa, Diamba: Histórias do Proibicionismo no Brasil terá ainda lançamento em São Paulo. O evento acontecerá no dia 14 de setembro, na Ugra Press, e contará com a presença do autor. Nos dias 15 a 17 de setembro, marcará presença também na Expocannabis, feira internacional sobre Cannabis medicinal e industrial que chega pela primeira vez à capital paulista.
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