Crônica: Dos suicídios

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RAZÃO E SENSIBILIDADE
Como o suicídio ainda é mantido sob os silêncios de um tabu
Por Rafaella Soares, repórter da Revista O Grito!. Colagem por James Gallagher

Parece mais uma sociedade secreta. Povoada de Virginias, Sylvias, Camiles, Ofélias, Julietas, Joanas, Medéias. Que encantamento obscuro as suicidas despertam? Quantas obras de arte, teses defendidas e traumas esmiuçados em divã não surgiram no seu encalço? Morrer é uma idéia acalentada por melancólicos ao longo dos séculos. Uma desistência acusada por uma síndrome de inadequação, uma punição para o alvo de um grande amor, o desfecho de ópera calculado em minúncias. A Insustentável Do Ser poderia descrever isso: um único lampejo lúcido na hora do desatino. E da dor.

Não fosse morte, suicídio, eutanásia, assuntos tabus. Na verdade, é raro encontrar o tema da morte e mais ainda, morte voluntária, sem reticências e opiniões vagas. Entender o suicídio é lançar um ponto de vista ameno sobre searas tão nebulosos para a maioria das pessoas – respeitando a subjetividade que há em cada um.

Ou talvez não, já que essas mesmas pessoas aumentam ano a ano as estatísticas de morte atribuídas como acidente em obituários e engordam significativamente as contas bancárias de fabricantes de ansiolíticos, antidepressivos e similares. Como decifrar algo tão profundo quanto a opção de dar cabo da própria vida com retórica de especialistas e religiosos? Impossível.

Cada pessoas sabe os corredores escuros não-mapeados na mente humana. Cada pessoas sabe a dimensão que o desamor, a traição, a perda, o sentimento de vazio e o desestímulo dentro do papel de si mesmo pode acarretar. E cada um sabe a dimensão que dá a isso. Mas é difícil que existam estados de espírito uma vez visitados, frequentes na cabeça. O mundo moderno, globalizado, etiquetado, diagnosticado, tem suas soluções para tudo. Ou você é depressivo ou bipolar, ou borderline. Tome este remedinho aqui. Sua pele é mista, seu cabelo seco. Compre isto. Sua taxa de colesterol é xis, cuide da longevidade. Não envelheça, não adoeça, fique rico, compre.

E pessoas são sensíveis, sabe, descontando o que fazem com o meio-ambiente. Descontando o cyber-lixo que os mantém reféns com próprio consentimento. Aí não tem análise que dê jeito. Não tem floral que dê jeito, nem pilates, nem tv de plasma, nem promessa de virada de ano. Assim como alguns indivíduos transpiram demais ou têm ereções com facilidade espantosa, alguns são tristes, pouco esperançosos ou por demais céticos, que seja. Um lance crônico.

É complicado pensar na contramão de uma maioria que planeja viver 100 anos ou mais. São os diletantes! Que sejam felizes. Da mesma forma merecem respeito a tímida parcela gauche de nós, os que descobrem – cedo demais? – as desventuras da nossa condição principal: humanos. E optam pelo plano B.

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