ENTRE GÊNIO E O RIDÍCULO
Birdman é parábola ácida e pretensiosa da fama e ambição na indústria do entretenimento
O diretor mexicano Alejandro González Iñarritu (Babel, 21 Gramas) apontou seu dedo acusador para a indústria do cinema de Hollywood neste novo Birdman, campeão de indicações ao Oscar e queridinho da temporada de premiações. O filme se arrisca em soar datado em pouco mais de 10 anos à frente ao tocar em pontos bem factuais do momento atual da cultura pop, como o culto aos virais online e a força das franquias de super-heróis.
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Estrelado por Michael Keaton, Birdman é também uma ode a si mesmo, com uma ambição em se configurar como a bravata definitiva contra o sistema atual da indústria cinematográfica e o star-system. A trama gira em torno de Riggan Thomson (Keaton), um ator que ficou famoso ao interpretar o super-herói do título em uma famosa trilogia. 20 anos depois ele decide apostar tudo em uma peça de teatro na Broadway como forma de recuperar relevância. O ex-astro decide pedir ajuda ao famoso ator de teatro Mike Shiner (Edward Norton) como forma de ancorar seu prestígio à produção. Mas como Shiner é um traste de difícil convivência esse plano acaba não dando muito certo.
Para completar, Riggan ainda precisa lidar com a aprovação de sua jovem filha saída da rehab interpretada por Emma Stone. As referências com a vida real dos atores chegam a ser óbvias: Keaton interpretou Batman nos dois filmes dirigidos por Tim Burton em 1989 e 1992 e poucos anos depois acabou entrando no ostracismo. Ainda na seara dos heróis fantasiados, Stone também deu sua contribuição como Gwen Stacy, a namoradinha do Homem-Aranha nos recentes filmes dos personagens. E por fim temos Norton, que aceitou de boa dar vazão em tela à sua fama de ator antipático e difícil de se trabalhar.
Filmado para dar a ideia de ser um único plano sequência, Birdman faz de sua pretensão um trunfo e uma ruína. A câmera busca os atores de maneira quase desesperada para dar uma ideia de fluidez, mas tanto virtuosismo torna a narrativa cansativa às vezes. Há também diversos efeitos especiais pontuais que aparecem para esclarecer um ponto de vista do diretor ou simplesmente para causar comoção. Esse exercício de técnica acaba se tornando um claro contraponto à história, que vai sendo ofuscada.
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No entanto, esse clamor de Birdman em ser diferente se relaciona bem com sua proposta: não dá para criticar o modus operandi da indústria sem se arriscar na forma. Neste quesito, Iñarritu acerta ao também dar sua cara à tapa em um filme que busca em praticamente todas as cenas uma fantasia, um chiste, um virtuosimo. A técnica é parte essencial do longa, por vezes beirando o ridículo, e dialoga bem com o objeto que se destina a atacar. Há bons momentos de interpretação em um elenco que tem ainda Naomi Watts e Zach Galafianakis. Já Keaton parece bem à vontade em seu papel mais relevante em muitos anos.
Difícil prever como Birdman envelhecerá nos anos posteriores, mas sua audácia um momento bem pontual de nossa sociedade do consumo já torna o trabalho interessante. Enquanto entretenimento, é uma comédia esquisita e pretensiosa que precisa chamar atenção a cada minuto para se sustentar. Fama e ambição é o motor que move o filme e faz dele uma parábola divertida e afiada do mundo do espetáculo.
BIRDMAN OU (A INESPERADA VIRTUDE DA IGNORÂNCIA)
De Alejandro González Iñarritu
[Birdman or (The Unexpected Virtue Of Ignorance), EUA, 2015 / Fox Filmes]
Com Michael Keaton, Zach Galifianakis, Edward Norton
8,0
Atualizado às 20h44, 01/02 (erramos): Michael Keaton interpretou Batman em 1982 e 1992 e não em 1992 e 1993 como informamos erroneamente. O texto foi corrigido.