Crítica: Ferrugem e Osso, de Jacques Audiard

Matthias Schoenaerts

rust-bone-carry

AMOR EM TEMPOS DE CRISE
Ferrugem e Osso foge do tom meloso para mostrar relacionamento de duas pessoas massacradas pela vida

Ferrugem e Osso foi o grande hit de 2012 dentro do cinema que promete redenção através de uma história de superação. Depois de “chocar” alguns críticos no festival de Cannes de 2012, o longa rendeu várias indicações de melhor atriz para Marion Cotillard (menos no Oscar, onde foi esnobada). A história mostra a imprevisível relação entre uma domadora de orcas que perde as pernas e um ex-boxeador sem emprego. O filme foi um dos destaques do Festival Varilux de Cinema Francês, que acontece em 45 cidades do país, incluindo Recife, Rio e São Paulo.

Leia Mais
Veja a programação completa
Veja a programação dos cinemas

Com exceção de alguns poucos momentos, o drama é filmado de forma fria e distante pelo direto Jacques Audiard, que coloca a audiência em situações desconcertantes, sem mascarar a dor da personagem de Cotillard. A narrativa chega a ser fria ao expor todo o sofrimento de alguém que perdeu as duas pernas, sua adaptação, as dificuldades de andar, os closes nos membros amputados. O trabalho de câmera preza pelo minimalismo e detalhe – será impossível resistir a olhar. Talvez desse modo, Audiard queira criar uma distância entre seu olhar e o espectador. Como se dessa forma seca e aparentemente insensível, ele tentasse fugir da acusação de ter sido meloso ou apelativo.

Rust_&_Bone_slaider

Mas Ferrugem e Osso não é um filme sobre a mulher que perde as duas pernas. Depois de certo tempo, realizamos que se trata da história de Ali (Matthias Schoenaerts), um ex-boxeador que perdeu tudo e que agora precisa se virar como pode. Desempregado e com um filho pequeno para criar, ele vai morar com a irmã, uma humilde caixa de supermercado. Em busca de dinheiro – mas também de alguma autoestima – ele passa a participar de lutas clandestinas. É um longa que tem a crise econômica como pano de fundo– o amor nos tempos de crise, seria uma sinopse mais justa. De algum modo, o roteiro nos impele a pensar que decisões erradas também são causadas pela luta injusta contra a pobreza.

ferrugem

O encontro de Ali com a domadora Stephanie é bastante improvável. Ele a conhece em uma boate onde trabalhava como segurança. Ela entra em contato depois da cirurgia que amputou suas pernas. O relacionamento dos dois vai se desenvolvendo bem lentamente, mas ficamos conhecendo pouco sobre o que ambos sentem realmente um pelo outro. Na distância imposta pelo diretor, conhecemos apenas a superfície dessa relação, e observamos tudo de longe. O trabalho dos dois atores impressiona pela nuance de detalhes – uma vez que eles não podem revelar muito por causa do roteiro. É um trabalho de corpos, de expressões, muito mais do que falatório ou mesmo da narrativa.

De um lado, vemos a fragilidade da deficiência física de Stephanie e do outro a brutalidade e violência de Ali, sua falta de afeto. É desse embate que o filme vai desenvolvendo seu desfecho, um alento para mostrar que tanto as adversidades do meio quanto uma transformação física tão trágica podem encontrar uma saída.

ferrugem_cartazFERRUGEM E OSSO
De Jacques Audiard
[De rouille et d’os, FRA/BEL, 2012 / Sony Pictures]
Com: Marion Cotillard, Matthias Schoenaerts, Céline Sallette

Nota: 8,6

 

Matthias Schoenaerts