Batem à Porta
M. Night Shyamalan
EUA, 2023, 1h40, 16 anos. Distribuição: Universal Pictures
Com Dave Bautista, Rupert Grint, Jonathan Groff e Ben Aldridge
Em cartaz nos cinemas
É quase impossível ler o nome de M. Night Shyamalan nos créditos de qualquer produção e não associá-lo, de imediato, às suas grandes reviravoltas – venham elas para o bem ou para o mal. No recém-lançado Batem à Porta, porém, o diretor abre mão desse recurso para apresentar um trabalho mais comedido. O problema é que o uso desse adjetivo aqui não significa que a obra esteja livre de exageros.
A trama acompanha a família formada pelo casal gay Andrew (Ben Aldridge) e Eric (Jonathan Groff) e sua filha Wen (Kristen Cui). De férias numa cabana em meio a floresta, eles logo veem o lugar aconchegante se tornar um pesadelo quando são encurralados e viram reféns de quatro estranhos armados. Em tom profético, o grupo de invasores, liderado por Leonard (Dave Bautista), revela à família uma terrível decisão: um dos três deve morrer para que a humanidade seja salva do seu fim.
A história, que é inspirada no romance de terror O Chalé no Fim do Mundo, do escritor Paul Tremblay, deixa desde o começo tudo muito bem delineado: é a premissa apocalíptica acompanhada de um dilema moral perverso que vai dar o tom da tensão entre os personagens. E, por incrível que pareça, não existem vilões – são todos humanos tentando dar o melhor de si para salvar sua própria família ou o mundo.
É nessa humanidade atribuída aos personagens que reside um dos pontos mais fortes da narrativa. Até mesmo o quarteto – verdadeiros Cavaleiros do Apocalipse que poderiam ser facilmente vilanizados – ganham alguma camada de vulnerabilidade. Para o casal, em especial, esse ponto atinge outro patamar com flashbacks que exploram violências sofridas – nos revelando as motivações por trás das suas escolhas.
Contudo, o roteiro pouco eficaz nega à trama maiores aprofundamentos. Além de explicar mensagens de uma forma óbvia – parecendo subestimar o espectador –, a forma como o absurdo apocalíptico é retratado, com suas exageradas ondas gigantes e aviões em rota de colisão, não convence Eric e Andrew daquela realidade e elimina qualquer possibilidade do casal se debruçar sobre o impasse moral ali envolvido.
À procura, na maior parte do tempo, de uma resposta minimamente razoável para o que acontece, poucos são os momentos em que os dois ponderam sobre o fardo que lhes foi imposto. E é por isso que depois de um certo tempo, a atmosfera de tensão criada passa a não ser tão convincente. Se por um lado o dilema moral poderia ser mais decisivo para os rumos da trama – martelando por um bom tempo na cabeça do espectador –, no fim das contas a abordagem dada o renega a segundo plano.
Sem lançar mão das sutilezas, Batem à Porta torna-se um suspense morno, mas que, ainda assim, vale a pena ser assistido. Ainda que não traga nada de extraordinário, o longa pode indicar uma possível virada de rumo na carreira do diretor, fortemente marcada por seus altos e baixos. É bom ficar atento.
Leia mais críticas de filmes:
- “As Polacas”: melodrama de João Jardim nasce datado e desperdiça eficiência do elenco
- “Queer”: Quando desejo e drogas alucinógenas se dão os braços
- “Clube das Mulheres de Negócios”: boas ideias esbarram em narrativa acidentada
- “Wicked”: adaptação do musical da Broadway é tímida, mas deve agradar fãs de Ariana Grande
- “Herege”: com boa premissa, novo suspense da A24 se perde em soluções inconvincentes