De Nantes (França)
Um dos diferenciais do festival Sofilm Summercamp, em Nantes, França, é a realização de atividades voltadas para a produção audiovisual a partir de novas possibilidades criativas. Na programação desse ano uma dessas ações foi o ateliê de videastas para web, conjugado com a masterclass para séries web, promovido pela Creative Factory, operador de desenvolvimento de redes para as indústrias culturais e criativas da cidade de Nantes, e a associação Creative Maker, uma incubadora de talentos para profissionais do audiovisual.
O ateliê teve como principal objetivo levar aos participantes conhecimentos de como monetizar, difundir e divulgar suas criações, enquanto a masterclass trouxe profissionais de destaque no ramo das séries web na França para compartilharem suas experiências em torno de um gênero que vem ganhando cada vez mais espaço na internet. Participaram da masterclass o videasta web Davy Mourier, o roteirista e também realizador de séries Guillaume Cremonese, e a realizadora Camille Ghanassia.
A realização de séries para web é hoje, na França, um caminho profissional em consolidação. Elas são herdeiras dos vídeos amadores dos anos 1990 feitos principalmente por grupos de admiradores de animes japoneses que circulavam em festivais voltados para os fãs do gênero. Essas produções, todavia, eram vistas com desprezo pelos videastas profissionais e realizadores de curta-metragem. Com os equipamentos de filmagem digitais e o surgimento da internet e de plataformas como o YouTube, a partir de 2005, a exemplo do que aconteceu em outros países, essas produções se tornaram mais baratas e passaram a ter um espaço de difusão adequado aos seus propósitos.
Hoje, as séries para web têm obtido um sucesso crescente, cativando um público fiel, e têm atraído a atenção de investidores tradicionais como o canal de televisão France 4 e sua plataforma Studio 4.0. Empresas ligadas a esfera da cultura geek, a exemplo da Akama, especializada em desenvolvimento de projetos crossmedia e mídias transitivas, também estão de olho nesse segmento. Do mesmo modo os criadores estão se esforçando para melhorar a qualidade de seus trabalhos com vistas a obter o reconhecimento das séries web como via de expressão e fomentar o aparecimento de sistemas de financiamento.
Entre os participantes do masterclass no Sofilm, Davy Mourier foi, sem dúvida, o que falou com mais propriedade sobre o tema. Ele atravessou todas essas fases, pois começou a fazer filmes amadores ainda na década de 1990 e sua carreira, que inclui também a realização de quadrinhos, mescla participações em programas de televisão e na web. Desde 2012, ele produz regularmente esquetes e séries web para o canal France 4, onde a mais conhecida é a série Reboot.
Com uma forte vocação para o humor, Mourier disse ter saudade do tempo em que fazia produções para internet apenas para se divertir e sem ter que se adequar aos padrões formais impostos pelos financiadores, mas que o dinheiro lhe permitiu produzir com mais qualidade e atingir um público maior e mais diversificado. “Antes nós fazíamos um trabalho e não sabíamos o destino dele, quem poderia querer mostrá-los, e hoje somos procurados por produtores”, afirmou.
Como Mourier, Guillaume Cremonese fazia curta-metragem como cartões de visitas para chamar a atenção de produtoras. Hoje, ele desenvolve projetos para o canal de televisão franco-alemão Arte e também France 4, para quem produziu a série Duplex. Entre os trabalhos que lhe deram visibilidade estão a série web Post-Coitum (2012) e Paris by Night (2014). Cremonese faz questão de separar bem o trabalho dos youtubers, voltado para questões do cotidiano e uma pegada mais individual, com o que é desenvolvido para séries web. Ele afirma que “para essas produções é preciso inovar, ser diferente do que é feito na televisão e se adequar a linguagem e o modo de funcionamento das novas plataformas”.
Camille Ghanassia é uma das poucas mulheres nesse universo das séries para web. Seus primeiros trabalhos surgiram no boom do gênero na web e ela lembra que foi muito importante quando ela e a amiga Sophie Garric se juntaram para ocupar aquele espaço. Seu primeiro trabalho de destaque foi a série Le Meufisme (meuf é uma gíria que substitui a palavra femme) que apresentava questões feministas de uma forma humorada e, graças ao sucesso na web, ganhou apoio do Canal Plus a partir da terceira temporada. “Foi uma forma de estratégia, porque mesmo ainda hoje existem muitas realizadoras que fazem esquetes, mas não séries”, disse. Ela reconhece que por conta da multiplicação de produções, conseguir visibilidade no YouTube, por exemplo, se tornou algo muito mais difícil, por isso ela acha importante a profissionalização de modo que a produção para web possa pagar bem os integrantes das equipes de realização.
Para o público jovem que acompanhou a masterclass os recados foram dados. Para fazer sucesso hoje na web, uma série deve chamar a atenção do público com algo diferente do que ele já pode ver nos canais de televisão. Deve lembrar também que as produções convencionais para cinema e televisão já fazem séries convencionais muito bem. Portanto, ao criar um canal para exibir seu trabalho, o realizador deve fazer o que ele quer fazer e não copiar o que já existe.
O trabalho em equipe foi outro fator importante apontado pelos animadores da masterclass. Saber juntar pessoas criativas de diversas áreas, desde bons atores a técnicos talentosos que saibam tirar o melhor dos recursos disponíveis, é um elemento fundamental, assim como investir no aspecto artístico e não pensar apenas na audiência. Por fim, não esquecer de ser criativo na hora de promover o produto final. Usar as ferramentas usuais como divulgação nas redes sociais, mas também realizar ações como shows de lançamento e usar processos interativos para divulgação da série.