Em seu segundo ano na Coudelaria Souza Leão, um espaço bucólico escondido na Zona Oeste do Recife, o festival No Ar Coquetel Molotov reafirma uma nova vocação de ser palco de experimentações de diversas artes: além dos já esperados novos nomes do cenário independente, o evento vem buscando uma aproximação cada vez maior com outras linguagens, sobretudo moda e artes visuais.
Mais do que “uma noite com show de bandas”, o No Ar se propõe a vender uma experiência, um diz que começou cedo na feira de grifes locais e terminou com a apoteose rapper de Emicida.
Nesta edição 2015, apenas o segundo ano desta nova proposta, o Coquetel conseguiu ocupar melhor os espaços. No ano anterior, a sensação de espaços vazios era desconcertante. Desta vez era possível se entreter com diversas atividades que nunca paravam. Cerca de 5 mil pessoas compareceram neste ano, segundo a organização.
Os shows nos três palcos se intercalavam. O primeiro começou já às 15h, na área do gramado próximo à entrada, com nomes interessantes como Câmera e Dirimbó. No palco Sonic, em um elevado próximo à entrada da Coudelaria se apresentaram os promissores Sofia Freire, Rico Dalasam e o carioca Omulu. Destaque ainda para o som viajado do Mahmed.
No interior da Coudelaria, os shows do Velvet, o palco principal, competiram com as diversas atrações que aconteciam do lado de fora: além dos shows o evento ainda trouxe o Som na Rural, uma praça de trailers de comida, performances no gramado, feira de zines, feira e até uma taróloga (!). Entre os destaques do palco Velvet estavam a banda Tono, que contou com a presença de Ney Matogrosso ao final da apresentação e a cantora Ava Rocha. Ava fez uma das apresentações mais fortes, com ótimo trabalho de interpretação e arranjos pesados.
Mahmundi foi uma grata surpresa. Muitos dos que estavam ali aguardando a banda Tono e Cidadão Instigado, que viriam em seguida, curtiram o show da cantora, que mistura pop, dance e MPB.
Mas foi o show do Cidadão Instigado um dos mais ovacionados. A banda trouxe ao No Ar o show inédito do seu novo disco, Fortaleza, lançado no mês passado. Fernando Catatau trouxe novas faixas como “Land of Light”, mas também sucessos como “Lá Fora Tem”. O ponto alto foi quando segurou o cartaz do movimento feminista “Deixa Ela Em Paz”, que pede o fim do assédio e agressões contra mulheres.
O final do No Ar trouxe o show de Emicida, Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa…. O rapper, maior nome do gênero hoje no Brasil, discutiu questões de raça, classe, diáspora africana e ainda trouxe lembranças da infância. O show de Emicida é bem explosivo, sempre no limite e abre um diálogo permanente com a plateia. Além dos novos hits como “Passarinhos”, “Mufete” e “Boa Esperança”, o rapper ainda trouxe seus clássicos como “Levanta e Anda” e “Rinha”. Em “Mãe”, faixa do novo álbum em que fala de sua mãe, Dona Jandira, ele sentou ao palco e não conteve as lágrimas. Várias pessoas da plateia também estavam aos prantos.
Emicida ainda faz um intercâmbio com outros nomes da música pop nacional que também problematizaram as questões raciais. Por isso são pontos altos do show as versões que faz de “Haiti”, de Caetano Veloso (Pra ver do alto a fila de soldados quase todos pretos/Dando porrada na nuca de malandros pretos”) e “Preciso Me Encontrar”, de Cartola. Com uma banda incrível e quase sem presença de beats, o show de Emicida tem o peso para provocar um rebuliço na música pop para sempre.
Mais fotos de nossa cobertura do No Ar 2015. Todas as fotos por Fernando de Albuquerque/OGrito!.