Blue Jean
Georgia Oakley
Reino Unido, 2022, 1h37. Drama. Distribuição: Synapse Distribution
Com Rosy McEwen, Kerrie Hayes, Lucy Halliday
Infâmia (The Children’s Hour), de 1961, dirigido por William Wyler, foi um dos primeiros filmes hollywoodianos a insinuar, mesmo de forma velada, a existência de uma relação homoafetiva entre duas mulheres. Estrelado por Audrey Hepburn e Shirley MacLaine e adaptado de uma peça da dramaturga Lilllian Hellman, tem como trama a história de duas professoras amigas que montam uma escola internato para meninas e têm as vidas arruinadas por causa de uma aluna que, sem provas, espalha a informação de que elas seriam lésbicas. O longa Blue Jean, atualmente em cartaz, embora esteja ambientado na década de 1980, em Manchester, na Inglaterra, traz elementos dramáticos os quais, de alguma forma, lembram o filme de Wyler.
Dirigido pela estreante Georgia Oakley, Blue Jean tem como cenário principal uma escola pública onde Jean (Rosy McEwen) é professora de educação física. Por ser lésbica, Jean leva uma vida dupla, pois teme que sua sexualidade seja descoberta e ela perca o emprego. O ano em que a trama se desenrola é 1988, em plena era Thatcher e com o governo conservador encabeçando uma campanha contra a população LGBTQIAPN+. Diferente de sua namorada Viv (Kerry Hayes), assumida e militante, Jean vive assustada e em conflito consigo mesma e com quem a cerca, até que uma aluna, também lésbica, coloca em xeque a sua omissão e o medo de enfrentar sua verdadeira identidade.
A trama desenvolvida não tem muita novidade com relação ao tema e ao eterno dilema vivido por gays e lésbicas cis: “sair ou não sair do armário?”, sobretudo se pensarmos que, atualmente, para muita gente essa é uma questão superada. Todavia, vale lembrar que, em muitos locais e grupos sociais, essa é uma situação ainda presente e motivo de diversos transtornos para quem a enfrenta.
Por esse viés, o roteiro escrito por Oakley tem o seu valor por colocar como a imagem que se fazia das lésbicas no período, consideradas subversivas e problemáticas, afetava muitas mulheres tanto na sua vida social, quanto na intimidade pelos conflitos que desencadeava até mesmo nas relações amorosas.
O drama vivido pela personagem Jean é como se a trama do filme Infâmia estivesse totalmente integrada ao seu mundo pessoal, o que revela o quanto a discriminação, o preconceito, em suma, a homofobia são fontes de tormentos e dor, não importa se nos anos 1960 ou hoje. Este talvez seja o maior mérito de Blue Jean, mostrar o quanto o contexto social e político forja atitudes que precisam ser compreendidas.
O estado repressivo aciona e legitima a intolerância, como mostra o filme, e nem todo mundo está preparado para enfrentar a rejeição familiar ou ficar sem meios de subsistência. A bela atriz Rosy McEwen está bem convincente como Jean e boa parte da empatia que o filme provoca é graças a sua sensível interpretação, o que inclusive a levou a receber o prêmio de Melhor Atriz no British Independent Film Award.
Por outro lado, como declarou a própria realizadora, o seu trabalho visou também resgatar como as pessoas resistiram aos ataques do governo de Margaret Thatcher em redes de solidariedade e engajamento político. Ou seja, o “ninguém larga a mão de ninguém” é um lema que precisa ser lembrado todos os dias. E isto tudo foi embalado com uma narrativa com momentos bem fofinhos e uma trilha musical muito bacana para quem curte os hits dos 80’s.