Trabalhadores da cultura pernambucana se reuniram de forma online, na noite dessa quarta-feira (2), para discutir o atraso nas parcelas do edital 2021/2022 do Funcultura, o principal mecanismo de fomento à cadeia produtiva do setor artístico em Pernambuco. A mobilização aconteceu poucos dias depois de uma reunião extraordinária ser realizada pela classe audiovisual pernambucana, que, diante da dimensão do problema com os pagamentos, convocou outras linguagens para ampliar o debate e buscar respostas coletivamente.
“A gente está vendo paralisar os projetos, paralisar a cultura e paralisar a vida de muita gente”, comentou uma representante de cinema na reunião. Entre as principais pautas discutidas estão a judicialização da dívida do Funcultura e a convocação de um ato público, que deve acontecer no próximo dia 21, com elaboração e entrega de carta na sede da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco, a Fundarpe, órgão vinculado à Secretaria de Cultura de Pernambuco (Secult-PE) responsável por gerenciar o fundo.
No encontro, estiveram trabalhadores das áreas de fotografia, audiovisual, dança, artes visuais, teatro e design. Todos enfrentando o mesmo problema, do litoral ao Sertão do Estado. Neste primeiro momento, segmentos como música, literatura, artesanato e cultura popular ainda não marcaram presença, mas a expectativa é de que mais entidades representativas ligadas a essas áreas endossem o coro à medida em que novas reuniões forem acontecendo. É a primeira vez que todas as linguagens se articulam para pressionar a gestão estadual dessa forma, tarefa difícil dadas as particularidades de cada segmento.
Mapeando atrasos do Funcultura
A Associação Brasileira de Documentaristas e Curta Metragistas de Pernambuco / Associação Pernambucana de Cineastas (ABD-PE/APECI), a Rede Interiorana de Produtores, Técnicos e Artistas de Pernambuco (RIPA), a Associação de Profissionais do Audiovisual Negro (APAN), a Federação Pernambucana de Cineclubes (FEPEC) e o Diretório Acadêmico de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal de Pernambuco (DACINE-UFPE) unem esforços, através da aplicação de um formulário, para um mapeamento dos profissionais impactados e do montante total em dívida com os projetos contemplados. A estimativa é de que cerca de 800 pessoas tenham sido afetadas.
“Das vezes que eu participei do Funcultura, que tive projetos contemplados, eu nunca vi um atraso como esse”, confessou uma representante da área de fotografia. “Não envolve só o atraso para começar a movimentar os projetos, mas também outros prejuízos”, completou. Devido a necessidade de abertura de uma conta corrente para o recebimento das parcelas, muitos proponentes relatam que estão tendo que arcar com as taxas de manutenção bancária de contas que sempre estiveram vazias.
“[O setor de] Design se encontra na mesma situação”, compartilhou uma produtora. “Nós temos um projeto, que já estava em execução, para receber a segunda parcela para finalizar, mas, desde dezembro do ano passado, a gente não recebe”, finalizou. Assim a situação se arrasta há oito meses, com os relatos se repetindo, embora as áreas de atuação mudem. “Em artes visuais, está tendo muito atraso também”, confidenciou outra trabalhadora. “Eu estou contando com esse dinheiro. A gente trabalha com isso, precisamos desse dinheiro. Eu estou vendo artista aí passando necessidade”, desabafou.
Fundarpe diz que pagamentos seguem em “bom ritmo”
Procurada pela reportagem, a Fundarpe respondeu em nota: “A Superintendência do Funcultura recebeu a nova programação financeira da Secretaria da Fazenda para pagamento dos projetos aprovados nos editais e retomou em um bom ritmo os trâmites previstos para sua efetivação.”
Contudo, a falta de diálogo e transparência por parte do órgão tem sido uma dor de cabeça recorrente para os produtores, que contam se deparar a todo instante com novos critérios e regras que impedem o pagamento do dinheiro. “A gestão parece não ter abertura real para um diálogo franco, seja no conselho de políticas culturais ou outros espaços. No conselho de audiovisual nem se fala, porque não está acontecendo a discussão ali. Enfim, não existe um canal de interlocução direta com esse executivo”, lamentou um dos participantes.
Em respeito aos trabalhadores, mantivemos todos os relatos sob anonimato. Uma das principais preocupações é o medo de retaliações frente ao cenário de incertezas, o que se agravou nas últimas semanas quando surgiram denúncias no Ministério Público de Pernambuco (MPPE) sobre supostas irregularidades e interferências da Casa Civil em contratações artísticas logo após a saída do secretário de Cultura, o músico Silvério Pessoa. Até o momento a pasta segue sem titular e a presidente da Fundarpe, Renata Borba, assume o comando interinamente.
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