DOCE ESCURIDÃO
A inglesa Anna Calvi conquistou o pop com seu disco de estreia repleto de referências dark e melodrama ensaiado
Por Paulo Floro
Editor da Revista O Grito!
Quando ela surgiu, no início deste ano, tentaram revelar toda sua linhagem como forma de chamar atenção e também de legitimar sua criatividade. Em todos os veículos em que aparecia, a inglesa Anna Calvi era comparada a uma série de artistas como Nick Cave (ela chegou a abrir shows dele a pedido do próprio), Morphine e outras referências do “romântico dark”. Até Edith Piaf é usada para tentar “explicar” a moça. Mas, seu disco de estreia mostra que tanto as intenções quanto o resultado geral de seu debut mostram que ela tem força o bastante para firmar uma personalidade própria.
Não que a desagrade essas comparações, mas a imprensa acabou abraçando com vigor essa ideia de “um Nick Cave delicado e feminino, uma voz gutural”, etc. É muito lugar comum para alguem tão nova, mas o fato é que Calvi corresponde bem ao hype que tem recebido e à pressão de ser a aposta deste ano. A BBC a colocou na sua famosa lista Sound Of 2011, com os novos artistas que serão destaque do ano.
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Ela acabou encabeçando uma boa produção de álbuns femininos neste início de ano, como Lykke Li, PJ Harvey e Adele. Filha de pai italiano, Calvi cresceu repleta de influências musicais de outras culturas, como o flamenco. Ela fez parte de diversas bandas até chamar atenção do ex-guitarrista do The Coral, Bill Rider-Jones, que a levou para sua atual gravadora, a Domino.
Num início de sorte, ela recebeu a bênção de Brian Eno, que a chamou de “a melhor coisa desde Patti Smith” e de Nick Cave que a convidou para abrir alguns shows europeus de sua banda, o Grinderman. Por causa do contrato com a Domino, Calvi também excursionou com Interpol e o Arctic Monkeys.
Em seu primeiro disco, Calvi afirmou uma personalidade dark e teve sucesso na proposta. O disco homônimo é carregado de melodrama, mas de uma forma positiva. São temas que passam da delicada voz sussurrada para uma profusão de cordas e percussão, com algumas pitadas de exagero. Tudo parece exarcebado nessa estreia, as letras românticas sobre morte e amor, o mise-en-scene dos arranjos.
Canções como “I’ll Be Your Man” ficam a um ponto do brega, mas Calvi se mostra mestre em esconder o fato de que não se leva tão a sério assim. Todo o álbum parece uma atuação muito bem feita de um personagem caricato, brincando com o conceito de gótico. E, claro, ela explora muito bem sua beleza. Seu disco homônimo ainda passeia por momentos sexies e animados, como “Blackout”, um dos seus singles de sucesso e o desespero em “First We Kiss”.
Frescor no pop deste ano com uma proposta muito sofisticada e bem pensada, é uma das artistas que renovam o interesse do que melhor a Inglaterra ainda tem a oferecer.
ANNA CALVI
Anna Calvi
[Domino, 2011]
NOTA: 8,5