Alien: Romulus
Fede Alvarez
EUA, 2024. Terror/Ficção Científica. 1h59. Distribuição: Disney
Com Cailee Spaeny, David Johnson e Archie Renaux
Para além das métricas financeiras dos grandes estúdios, o que sustenta uma franquia cinematográfica? A qualidade das obras? O fanatismo dos seus fãs? Aliens: Romulus, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (15), é o nono (!) filme da saga dos ferozes extraterrestres. Depois do fracasso – de bilheteria e de crítica – do antecessor Alien: Covenant (2017), a nova produção carregava a expectativa de reciclagem para um universo tão desgastado. À exceção de algumas sequências mais inspiradas, este novo capítulo gravita sem risco por lugares confortáveis e carece de inovações estilísticas e narrativas.
Dirigido por Fede Alvarez, cineasta responsável por interessantes obras como o reboot A Morte do Demônio (2013) e o ótimo O Homem nas Sombras (2016), a atual jornada dos seres xenomorfos se localiza entre os primeiro e segundo filmes da franquia, no ano de 2142. Em uma colônia especial distópica, um grupo de jovens invade uma estação espacial abandonada com intuito de utilizá-la como transporte até Yvaga. O espectador mais atento logo perceberá: trata-se da Nostromo, nave de Alien – O Oitavo Passageiro (1979). Obviamente, os personagens logo se dão conta da companhia de uma forma de vida nada amigável no local.
Uma coisa não se pode negar: Alien: Romulus eleva o nível em relação aos fraquíssimos Alien: Covenant (2017) e Prometheus (2012), obras antecedentes e dirigidas por Ridley Scott, criador da franquia. Nas mãos de Alvarez, a narrativa ganha uma direção mais sofisticada, especialmente no primeiro ato do filme. A arquitetura de cenas introdutórias, da apresentação espacial do ambiente até o primeiro rompante de ação com os alienígenas, é formidável. Resgatando um pouco da estética de cores fortes de Alien – O Oitavo Passageiro, a fotografia de Galo Olivares sabe desfrutar bem da iluminação dos alarmes de emergência e dos faróis das naves.
Talvez por permanecer adstrito demais ao universo e às convenções da franquia, Alien: Romulus se empalidece ao decorrer da projeção. A insistência do roteiro em criar contagens regressivas – já vimos isso exaustivamente nas produções anteriores – ocorre aqui novamente, de forma menos fluida. As tiradas cômicas, frases marcantes, peculiaridades que outrora funcionaram com a personagem Ripley (Sigourney Weaver), no filme atual soam artificiais. É como se os realizadores tivessem uma cartilha de referências a ser preenchida para agradar o fandom.
Se uma das características da ficção científica é servir de alerta para os desmandos da humanidade com o avanço tecnológico, o filme de Fede Alvarez comete um disparate (e aqui, para quem quiser evitar detalhes sobre o filme, sugiro passar a leitura para o último parágrafo do texto). A obra tem a insolência de utilizar CGI/inteligência artificial para recriar um personagem do primeiro filme, cujo ator – Ian Holm – faleceu em 2020. A necromancia digital, pauta que cabe horas e horas de discussão, não me parece justificada; alguns leem como uma crítica aos rumos que a IA tem tomado na nossa sociedade (com os deepfakes, por exemplo). Não enxergo assim; parece-me mais uma tentativa nostálgica – de extremo mau gosto – de “ressuscitar” um personagem do clássico filme de 1979.
Há outro forte ponto de contato da nova produção com outro filme da franquia, o Alien: Ressurreição (1997): a aparição de um xenomorfo híbrido com traços humanos. Sem qualquer sutileza, o filme de Fede Alvarez quase grita na cara do espectador o fato de haver uma personagem grávida na tripulação. Não há o benefício da surpresa: quando a criatura híbrida aparece, só resta a curiosidade para saber sua aparência. Com pouco tempo de tela, o vilão metade-humano-metade-alien é até assustadorzinho, mas nunca uma ameaça aterrorizante que nos faça colar de medo na poltrona do cinema.
Com um ato final cheio de casualidades difíceis de tragar, Alien: Romulus é uma aventura apenas razoável no macrocosmo criado por Ridley Scott. O jovem elenco é eficiente, Cailee Spaeny demonstra segurança com o papel principal, mas convenhamos: em pleno 2024, colocar a protagonista feminina de short curto no clímax do filme? Fede Alvarez erra mais do que acerta.
Leia mais críticas
- “Dahomey”: poderosa meditação sobre a alma amputada do povo beninense
- “O Aprendiz”: Donald Trump e os fragmentos de uma vida sem escrúpulos
- “Emilia Pérez” mistura dramaticidade das novelas mexicanas à linguagem da música pop
- “Baby”: sobrevivência e afetos na noite queer paulistana
- “As Mulheres da Sacada”: fábula de horror feminista põe o dedo na ferida da misoginia