A Longa Marcha
Francis Lawrence
EUA, 2025. 1h48. Suspense. Distribuição: Paris Filmes
Com Cooper Hoffman, Mark Hamill e David Jonsson
Portador da insígnia de filme baseado em obra de Stephen King, A Longa Marcha lança olhar para o estado das coisas da sociedade norte-americana. Em novo mergulho nos universos distópicos, Francis Lawrence dirige uma história que reimagina o passado pós-Guerra para questionar os rumos hodiernos dos EUA sob administração de Donald Trump.
Nos Estados Unidos da história, grande recessão econômica acomete os cidadãos. O regime totalitário, cuja representação é personificada pelo caricato major interpretado por Mark Hamill, oferece aos jovens a oportunidade da Longa Marcha: sob escolta policial, 50 garotos devem caminhar indefinidamente por uma rota na qual não existe linha de chegada. A regra é simples: só haverá um vencedor. Todos os outros, desistentes por cansaço ou motivo qualquer, serão mortos. Ao vitorioso, grande prêmio em dinheiro para a tão sonhada mudança de vida. O espectador provavelmente perceberá ecos temáticos com a franquia Jogos Vorazes; curiosamente, com exceção do primeiro filme da saga, todas as demais quatro produções baseadas no universo criado por Suzanne Collins foram dirigidas pelo mesmo Francis Lawrence.
O principal desafio cinematográfico de A Longa Marcha é propor uma narrativa com limites claros: o filme, ao longo de sua projeção, acompanha a caminhada do início ao fim. Com pouquíssimas inserções de flashbacks, o filme consegue estabelecer um ritmo interessante, muito beneficiado pela sincronicidade do elenco. Em especial Cooper Hoffman e David Jonsson, ótimos na entrega daquilo que seus personagens exigem. O formato de pelotão no qual os personagens são inseridos é intencional e explícito: o subtexto da obra é denunciar o absurdo e a irracionalidade da guerra. Na mais bela tomada do filme, os jovens caminham ao fundo enquanto, em primeiro plano, vemos as lápides de um cemitério à beira da estrada.
Lamentavelmente, o roteiro de JT Mollner artificializa o desenvolvimento nas interações entre os personagens; abarrotado de frases de efeito, o texto se fundamenta em reflexões rasteiras sobre a existência humana. Mesmo para um filme que priorize o gênero, cheio de cenas de forte impacto gráfico, a dimensão discursiva pode ser mais densa, aliada à dramaticidade. Na contramão, o filme se satisfaz com a repercussão visual de cabeças dilaceradas e mantém-se fiel à superficialidade. Se a primeira morte choca o espectador pelo modo como é filmada, ao decorrer da narrativa a explicitude das execuções perde força – e a falta de tato estético é sentido até o fim da história.
Restrito aos personagens em marcha, o filme se estagna em discussões estéreis (sobre enxergar a luz nos dias mais trevosos e escolher não se vingar) sempre acompanhadas da trilha sonora, excessivamente emotiva, enquanto a direção de arte esparrama objetos ao longo da estrada na tentativa de conceber o clima funesto da nação. Carros em chamas, animais mortos, figurantes em estado de catalepsia. Resta-nos acompanhar a queda, um a um, dos participantes da Longa Marcha ao lado da curiosidade mórbida de como este ou aquele personagem será abatido. Sem adentrar em detalhes do desfecho, é curioso constatar como A Longa Marcha é autoindulgente em relação à retórica motivacional que adota ao longo do filme. A frágil tentativa da última cena soar surpreendente atesta a ineficiência da condução dramática proposta por Francis Lawrence.
Sem a mínima inventividade estilística, o cineasta entrega ao público um filme mediano que deve agradar o paladar do espectador mainstream. E Lawrence seguirá revisitando universos bem conhecidos: previsto para ser lançado em 2026, Jogos Vorazes: Amanhecer na Colheita está em fase de produção, com nomes de peso no elenco, como Ralph Fiennes, Glenn Close, Elle Fanning e Kieran Culkin. Outras continuações de obras previamente dirigidas pelo diretor estão no seu radar: Eu Sou a Lenda 2 e Constantine 2, ambas em pré-produção.
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