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A construção do amor na HQ A Adoção

Novo trabalho do belga Zidrou apresenta a relação entre avó e sua neta em uma trama envolvente (mas com reviravolta chocante)

A construção do amor na HQ A Adoção
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A Adoção
Zidrou e Monin
Nemo, 136 páginas, R$ 74,90, 2022.
Tradução de Renata Silveira

Em A Adoção, o roteirista Zidrou como já está virando um costume de suas obras, desvela novas e profundas camadas em uma história que à primeira vista pode parecer simples ou semelhante a outras que já vimos antes em algum lugar. A história tem ilustração de Arno Monin, tradução de Renata Silveira e é publicada pela Editora Nemo.

Tudo começa quando Qinaya, uma pequena órfã peruana de quatro anos, é adotada por uma família francesa, modificando para sempre a vida de todo mundo. Para Gabriel, no entanto, isso será ainda mais complicado: ele deverá aprender como ser um avô – logo ele que nunca muito tempo à tarefa de ser pai. 

Do primeiro contato distante a inesquecíveis momentos compartilhados, Gabriel e Qinaya vão, pouco a pouco, criando laços que o velho turrão sequer poderia imaginar. A premissa é singela, chegando a lembrar tanto aqueles filmes clássicos da Sessão da Tarde quanto algumas histórias do cinema europeu. 

De Up – Altas Aventuras a Central do Brasil diversas obras da sétima arte exploram essa dinâmica entre uma dupla improvável, formada por uma pessoa ranzinza e uma criança. Sempre há um estranhamento inicial até que a convivência constrói uma relação coberta de ternura que modifica a vida de ambos. Zidrou chega, inclusive, a mencionar no quadrinho o filme O Velho e o Menino (1967), espécie de grande expoente francês do gênero.

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Na primeira parte, a história caminha de forma tenra com a adaptação de Gabriel ao novo papel de avô presente na vida de Qinaya. Ele, inicialmente à revelia, passa a introduzi-la em seu mundo de conversas com o grupo de amigos, os gegês (os amigos têm nomes que começam com G), passeios pela França e corridas de bicicleta. Até ensina a neta a dar as primeiras pedaladas.

Muito naturalmente, assistimos ao emocionante amadurecimento dessa relação e como Qinaya amolece o coração de Gabriel. Um senhor que dedicou 50 anos de sua vida ao ofício de açougueiro e que se ressente de o filho não querer ter dado prosseguimento ao seu legado, seguindo na área levando o negócio da família adiante, o que o forçou a vender seu estabelecimento. 

Só essa trama da adaptação de Gabriel a Qinaya e ao papel de avô já lhe deixa preso nas páginas do quadrinho e seria suficiente para apontarmos a história como mais uma obra prima na carreira do escritor tamanha a beleza. É fascinante como uma criança inocente muda um ambiente, e qualquer trama que trate desse processo é emocionante. 

Mas, ele vai além. A trama dá uma reviravolta enorme, o que leva Gabriel a sair em busca de respostas. Será que ele tentará levar seu amor mais longe do que deveria? Ele parte então em uma viagem ao desconhecido Peru, em busca de uma solução. O que ele pode encontrar em uma terra tão distante? 

E assim acompanhamos também a saga de Gabriel em um país diferente à procura de algum conforto para os seus anseios. O que era uma história da conquista do amor de um avô ranzinza pela inocência de sua neta vira uma jornada imprevisível a partir de um fato que muda tudo. E é esse o mote da segunda parte de A Adoção.

Zidrou não costuma tomar os caminhos mais fáceis ou os mais previsíveis em suas histórias. O roteirista franco-belga vem se notabilizando por histórias em quadrinhos maduras, delicadas e com um ponto de vista singular sobre a família. E aqui, vale aprofundar um pouco sobre sua trajetória para os não-iniciados. 

Zidrou é o pseudônimo de Benoît Drousie, nascido em Anderlecht, na Bélgica, em 1962. O início da sua vida profissional foi como professor escolar, mas problemas com o método de ensino e com as escolas o fizeram assumir uma nova missão em vida: ser roteirista de gibis.

Um dos mais profícuos do ofício, Zidrou inicialmente escrevia quadrinhos engraçados para o público infantil. Só recentemente o autor entrou em uma fase mais adulta e dramática, e que curiosamente é a mais conhecida no Brasil. Embora represente apenas a fase mais recente e menor do autor, certamente é a mais produtiva.

Em A Adoção o roteirista, mais uma vez, surpreende com uma história sobre a construção do amor e as mudanças que ele provoca na vida de todos os envolvidos. Apesar do que aparenta, esse gibi é muito mais sobre perder e encontrar um filho. A relação de Gabriel com sua netinha acaba impactando em seu papel de pai de um jeito inesperado e bem construído como o belga vêm se especializando em fazer. 

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