londres quadrinhos 2
Fachada da Forbidden Planet, uma das maiores lojas de quadrinhos da Inglaterra. (Foto: Alexandre Figueirôa/Divulgação).

London, London: fazendo turismo de quadrinhos em Londres

Dos indies à cultura nerd, passando por museus com HQs dos anos 1900, Londres é um multiverso para leitores de quadrinhos

Este texto foi publicado originalmente na edição impressa da revista Plaf. Acesse a página especial da revista e compre as edições anteriores.

De Londres, Inglaterra

Para os fãs de quadrinhos, nada melhor do que aproveitar um passeio pela cidade de Londres para conhecer as lojas especializadas no gênero. Embora as revistas de super-heróis das grandes editoras Marvel e DC Comics ainda dominem as vendas e ocupem boa parte das estantes das livrarias, os títulos das editoras independentes se mostram cada vez mais criativos. A ampliação dos temas explorados com histórias de famílias, dramas adolescentes, diários de guerra, adaptações literárias, questões de gênero e lutas sociais despertam a atenção e tem ampliado o público consumidor. 

Isso pode ser percebido ao entrarmos numa loja como a Gosh! Comics, na Berwick Street, no Soho londrino, onde sempre topamos com uma significativa quantidade de homens e mulheres jovens interessados na diversidade de títulos oferecidos pelo estabelecimento. Encontramos publicações de editoras como a Image, IDW, Boom! Studios e Dynamite. A loja funciona há mais de 30 anos, tem uma ótima sessão de álbuns europeus e revistas independentes e realiza regularmente lançamentos de novas obras com a presença dos autores.

Mas é na megastore Forbidden Planet, na Shaftesbury Avenue, no centro de Londres, onde podemos comprovar melhor o quanto os quadrinhos estão em alta entre os britânicos. A rede possui lojas em outras cidades do Reino Unido e é a maior revendedora britânica de HQs e graphic novels recentes. Nela é possível encontrar ainda uma grande variedade de livros de ficção científica, DVDs, brinquedos, games e mangás. A loja investe nos últimos lançamentos, mas dispõe de um bom acervo de obras cult, sobretudo dos autores ingleses. 

Menos procurada, porém tão interessante quanto suas congêneres, uma visita na Mega City Comics localizada na Inverness Street, no bairro boêmio e cult de Camden Town é uma boa pedida. Criada em 1981, inicialmente funcionando apenas como uma empresa de vendas por correspondência, a Mega City é ideal para colecionadores, pois embora tenha revistas recentes, seu forte são as edições antigas de quadrinhos de super-heróis. 

Quadrinhos americanos e britânicos clássicos são também a especialidade da 30th Century Comics. Ela é bastante visitada por colecionadores por conta do seu catálogo com 100 mil itens estocados num edifício de dois andares, situado em Putney, no Sudoeste de Londres.  Os interessados podem também pesquisar no site da loja onde encontram publicações que vão de 1900 a 1980.

Quadrinhos no Museu

E para encerrar o tour, próximo ao monumental British Museum, na singela Little Russel Street, existe um espaço cultural bem mais modesto, mas não menos curioso. Trata-se do The Cartoon Museum, cuja coleção abrange os cartoons e comics britânicos do século 18 até os dias atuais.

Trimestralmente, o museu apresenta exposições temáticas e quando esta reportagem foi feita estava em cartaz Future Shock: 40 Years of 2000 AD, celebrando os quarenta anos deste fenômeno editorial cultuado no mundo todo e que tem como principal atração displays com oito páginas da arte original de cada década da publicação. A exposição HEROES, em cartaz até 25 de abril de 2024, aborda a explosão dos heróis britânicos nos quadrinhos.

O visitante tem ainda no local loja com revistas, livros a acessórios do universo das HQs e se ele tiver um tempinho pode aproveitar os workshops oferecidos tanto para adultos quanto crianças onde poderá aprender a criar mangás, personagens de animação, histórias de ficção científica e seu próprio comics.

forbidden planet londres quadrinhos

Forbidden Planet, esse monumento

O professor de sociologia da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Aristeu Portela é um aficionado dos quadrinhos. Ele esteve em Londres recentemente e conta para a Plaf! como foi sua visita a Forbidden Planet.

“A primeira impressão que tive foi um assombro com sua monumentalidade. Acredito que tenha sido a maior loja de quadrinhos (se é que podemos resumi-la a isso) que já visitei, e aquela que mais bem incorpora o entusiasmo atual em torno da cultura nerd, com os produtos mais variados oriundos de filmes, desenhos animados, videogames, séries de TV e, claro, quadrinhos.

É certo que em qualquer comic shop você vai encontrar, além das HQs propriamente ditas, livros, camisas, action figures, jogos e toda parafernália correlata, mas ali essa cultura me pareceu no ápice da sua valorização (e mercantilização) – não à toa, a área desses “produtos correlatos” corresponde à entrada da loja e, quando visitei, era de longe a mais movimentada de todas. 

Mas é ainda no setor de quadrinhos que eu acho que está o grande atrativo da Forbidden Planet. Fiquei muito entusiasmado com a variedade de HQs disponíveis, e não tive como evitar a impressão de que não conseguiria dar conta sequer de vislumbrar tudo. Ainda que o foco da loja pareça (mas posso estar enganado) ser os quadrinhos das grandes editoras estadunidenses (Marvel, DC, Dark Horse…), descobri por lá uma pequena surpresa, como uma seção toda dedicada a autores oriundos da revista 2000 AD, que durante boa parte da minha adolescência foi um sinônimo de quadrinhos britânicos.

Foi nessa seção que mais aproveitei meu tempo, folheando autores muito queridos como Alan Moore, Grant Morrison e Jamie Delano. Cresci me entretendo com esses nomes da chamada ‘invasão britânica’ dos quadrinhos estadunidenses, e não à toa escolhi para levar comigo histórias da revista que formou boa parte deles, a 2000 AD. Quando comecei a me formar como leitor, ainda na infância, o personagem de Juiz Dredd sempre evocava a ideia de tramas (e desenhos) audaciosas e perturbadoras, pouco convencionais. Como não tive oportunidade de ler muitas histórias dele, escolhi justamente edições que compilaram suas primeiras histórias na revista 2000 AD, escritas no final dos anos 1970.

Apesar de ter adorado a loja, me incomodou apenas a pouca atenção ao que poderíamos chamar de “quadrinhos independentes”. Comparado com o restante das seções, extremamente bem detalhadas em termos de dados e subdivisões, essa me pareceu de pouco destaque, não só em número como também em termos de informações relativas a origens dos autores, lançamentos etc. Isso, claro, pode ser reflexo do enfoque mais mainstream da loja, o que não é nenhum problema em si.

Todas as fotos por Alexandre Figueirôa/O Grito!

Leia mais reportagens da Plaf!

Edições da Plaf