Os 30 melhores quadrinhos de 2018

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Listas são divertidas por não serem absolutas. Os 30 gibis escolhidos pela equipe da Revista O Grito! querem comunicar algo além da maestria no domínio da narrativa dos quadrinhos. Olhamos para uma obra a partir do poder que ela tem de ressoar nos leitores e no seu tempo. HQs cuja importância deve perdurar no tempo (pelo menos assim acreditamos).

É um desafio enorme chegar nesta lista fechada, ainda mais em um ano com tantos lançamentos bons e com tantas editoras correndo riscos em lançar trabalhos de diversos gêneros e estilos.

Foi também um ano em que chegaram ao país autores importantes internacionalmente, mas que seguiam desconhecidos por aqui, a exemplo de Manuele Fior ou mesmo obras que fazem parte dos clássicos incontestes das HQs mundiais, mas que nunca tinham saído, como Mort Cinder, de Breccia e Oesteheld.

2018 também reparou erros editoriais históricos de nosso mercado. Foi o caso das edições definitivas de Bone, de Jeff Smith, que ganharam edição cuidadosa da Todavia e Estranhos no Paraíso, de Terry Moore, que saiu pela Devir. A Pipoca e Nanquim também tem feito um trabalho maravilhoso com edições lindas à altura da importância de seus autores, como Esteban Maroto e Chabouté. A Devir seguiu com sua coleção de mangás no formato tijolão, com volumes de Tenkon Kinkreet, de Tayo Matsumoto e Uzumaki, de Junji Ito.

Nos super-heróis foi também o ano das inovações, como Senhor Milagre e Visão, de Tom King, um ano muito bom do gibi mensal da Mulher Maravilha e HQs divertidas de Batman: Metal.

Nos independentes, potencializado por um FIQ no início do ano e uma CCXP em dezembro, vários autores lançaram trabalhos, incluindo diversos fanzines. Infelizmente, não foi possível ler tudo a ponto de fechar essa lista e HQs que potencialmente entrariam por aqui ficaram de fora, a exemplo de O Martírio de Joana Dark Side, de Wagner Willian.

Autores brasileiros ganharam destaque em 2018 com obras que saíram em 2017, como Marcelo D’Salete e seu Angola Janga. O livro foi a nossa escolha de melhor HQ do ano passado e este ano recebeu o reconhecimento merecido como o prêmio Jabuti e o HQ Mix. D’Salete também levou o Eisner, nos EUA, pela edição americana de Cumbe (que saiu pela Fantagraphics com o nome de Run For It). Já Marcelo Quintanilha teve seu Tungstênio adaptado para os cinemas e lançou uma HQ coletânea pela Devir.

Vale também o registro do período conturbado que vive o mercado editorial, com a derrocada de duas das maiores editoras do país, a Saraiva e a Cultura. Ainda assim, as editoras de quadrinhos seguiram com uma agenda de lançamentos robusta. É hora de rever o modelo de negócios e apoiar, mais do que nunca, o circuito independente de circulação dessas obras, seja eventos como o FIQ, Ugra Festa, Feira Miolo(s), bem como bancas e lojas especializadas.

Este ano também saiu a Plaf 2 depois de diversos atrasos. A revista teve capa de Mascaro e HQs inéditas de Brendda Costa Lima, Roberta Cirne, Felipe Portugal e Jô Oliveira.

A lista aqui d’O Grito! reúne os 30 melhores trabalhos lançados no mercado editorial brasileiro, tanto de autores brasileiros quanto estrangeiros. Como nos anos anteriores decidimos deixar de fora reedições de obras que já tinham saído por aqui, com exceção de trabalhos que tragam substancial material inédito.

Sem mais demora, com vocês, os melhores gibis deste ano.

Especial: Melhores de 2018
As 50 melhores músicas do ano
Os 30 melhores discos do ano
Podcast especial com o melhor do cinema, teatro e arte

Pela equipe da Revista O Grito!. Edição: Paulo Floro. Revisão: Túlio Vasconcelos.

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A Marcha Vol. 1, de Nate Powell, Andrew Aydin e John Lewis
(Nemo)

A Marcha traz a longa batalha de Lewis e Martin Luther King pelos direitos humanos e civis em uma narrativa bem construída que relata a segregação racial, ataques da polícia até chegar ao recebimento da Medalha Presidencial pelas mãos do primeiro presidente negro dos EUA. Um trabalho necessário e que faz uma ponte importante com a luta atual pelo fim do racismo. | Compre.

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Imaginário Coletivo, de Wesley Rodrigues
(Darkside)

Imaginário Coletivo é o primeiro quadrinho de Wesley Rodrigues, autor que é mais conhecido por seu trabalho com animação (ele já venceu festivais como Animage, Anima Mundi, entre outros). Nessa sua estreia autoral em quadrinhos ele explora uma fábula sobre liberdade ao mostrar a história de uma vaca que queria ser um pássaro. Um trabalho com um traço bastante solto e cuja narrativa corre riscos ao dar vazão ao fluxo do inconsciente. | Compre.

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Black Hammer Vol.1 – Origens Secretas, de Jeff Lemire, Dave Stewart e Dean Ormston
(Intrínseca)

Muitos trabalhos já buscaram desconstruir o gênero dos super-heróis, uma instituição cultural da cultura pop ocidental. Mas Jeff Lemire, hoje um dos autores mais celebrados de sua geração, traz uma visão original com ideias que buscam referências a personagens clássicos do passado, romance sci-fi e terror dos anos 1950. A HQ também traz elementos típicos de sua obra, como as relações familiares e traumas do passado que insistem em assombrar no presente. | Compre.

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Raul, de Alexandre de Maio
(Elefante)

Um dos nomes mais importantes do jornalismo em quadrinhos no país, De Maio usou o preto e branco para contar a história e desenhou os personagens sem rosto, como forma de evidenciar que a história contada, apesar de inusitada, é a mesma de milhares de jovens do Brasil. Uma história de desigualdade social como pano de fundo para as possibilidades trazidas pelo crime. Além de ser um dos melhores materiais do gênero jornalismo em quadrinhos que saíram este ano, a HQ ainda apresenta inovações na linguagem do meio. | Compre.

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Ânsia Eterna, de Verônica Berta
(Sesi-SP)

Em sua primeira HQ, Verônica Berta aceitou o desafio de transpor para os quadrinhos os textos da escritora Julia Lopes de Almeida lançados em 1903. E conseguiu imprimir um tom particular que transparece a surpresa, o grotesco e a tensão presente nos textos originais. A forma como usa a pintura digital para montar sua narrativa é algo impressionante. | Compre. 

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Refugiados – A Última Fronteira, de Kate Evans
(Darkside)

A britânica Kate Evans fez um trabalho poderoso de jornalismo em quadrinhos, unindo uma reportagem articulada e bastante informativa com uma narrativa que é também emotiva, crua e verdadeira. Ela revela o cotidiano dos campos de refugiados em Calais e Dunquerque através de sua perspectiva como voluntária de missões humanitárias. Sua HQ nos apresenta rostos e histórias de pessoas reais que são desumanizadas por políticos e por parte da mídia. | Compre. 

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Cavalo de Teta, Vol. 2, de João Pinheiro e Diego Gerlach
(Independente)

A revista Cavalo de Teta, organizada por João Pinheiro, é cria de seu próprio tempo. É a HQ que melhor resume os tempos loucos que vivemos. Seu escracho para tratar de temas políticos segue como uma frente importante de resistência contra o fascismo e o autoritarismo que chega com força. Com trabalhos de MZK, Diego Gerlach, Schiavon, Evandro Alves e do próprio Pinheiro, a publicação traz bastante experimentação no traço e na narrativa, mas sua maior contribuição é tirar o verniz de normalidade que ainda vemos na imprensa. | Compre.

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Cadafalso, de Alcimar Frazão
(Mino)

O livro reúne cinco histórias com um tom existencialista para falar da vida absurda em diferentes momentos da humanidade, tratando de temas como extremismo, religião, arte. Frazão chamou três nomes importantes dos quadrinhos brasileiros para coassinar roteiros: Lourenço Mutarelli, Dalton Cara e Magno Costa. Lançado em um período tão desequilibrado da democracia brasileira, a HQ ressoa de maneira esquisita, como se sofresse uma influência dessa falência do projeto civilizatório do País. Os personagens do livro se veem o tempo todo confrontados com o absurdo da vida e reagem a ele de maneira consciente, sendo levados a conviver com esse absurdo e buscar saídas, ora irônicas, ora revoltosas, para seguirem adiante. | Compre.

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A Origem do Mundo – Uma História Cultural da Vagina ou a Vulva Vs. O Patriarcado, de Liv Strömquist
(Companhia das Letras)

O livro da sueca Liv Strömquist reflete sobre séculos de esquizofrenia das sociedades em relação à vagina. Desafiando tabus e descortinando mitos, a autora desnuda a misoginia que ainda domina quando o assunto é o corpo da mulher. O humor de Strömquist é bastante árido e seu livro assume uma necessária postura assertiva, sem rodeios, o que faz desse trabalho um dos mais importantes tratados feministas deste ano. | Compre.

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Me Leve Quando Sair, de Jessica Groke
(Independente)

Lançada no último Festival Internacional de Quadrinhos (FIQ), a HQ marca a estreia da quadrinista e fala de uma viagem ao lado de seu irmão para Paraty (RJ) em 2016. O roteiro desenvolve a relação fraternal ao mesmo tempo em que revela aos poucos segredos e questões familiares que marcaram a vida dos personagens. Mas o que mais impressiona é o modo como a autora experimentou na narrativa dos quadrinhos para contar sua história. É como se as características próprias dessa mídia a ajudassem a refletir sobre as relações familiares que estavam sendo contadas. Um dos trabalhos de estreia mais impressionantes que lemos em 2018. | Compre.

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Saga Vol. 6, de Brian K. Vaughan e Fiona Staples
(Devir)

Uma família não-tradicional enfrentando séculos de violência e conflitos e tentando encontrar seu lugar no universo. Um drama épico que remete a clássicos da literatura mundial, mas que aqui ganha uma vibrante releitura nas mãos dos talentosos Brian K. Vaughan e Fiona Staples. Saga vem entrando em nossa lista de melhores praticamente todos os anos e a saga do casal intergaláctico e sua filha birracial só melhora, o que faz dessa série uma das melhoras obras do quadrinho mainstream dos EUA. | Compre.

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Black Dog – Os Sonhos de Paul Nash, de Dave McKean
(Darkside)

Dave McKean é muito conhecido dos leitores brasileiros por conta de suas colaborações com Neil Gaiman na série Sandman e em Violent Cases, mas seu trabalho autoral solo também merece ser descoberto. Sua nova HQ é baseada na vida de Paul Nash, pintor surrealista inglês que combateu na Segunda Guerra Mundial e cuja produção foi bastante influenciada por essa experiência. McKean aborda esse período conturbado da vida de Nash através de uma narrativa que utiliza diversas técnicas para contar uma história de sonho e terror. | Compre.

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Nonnonba, de Shigeru Mizuki
(Devir)

A contribuição de Mizuki para a construção do gênero biográfico no mangá foi mostrar que é possível criar narrativas além do drama realista e histórico. Ao trazer sua própria subjetividade para um campo do sobrenatural ele reforçou o poder do imaginário japonês ao mesmo tempo em que criou uma panorama daquele período. Uma ainda rara mistura do estilo shounen e horror. E fez isso de maneira divertida, lúdica, mas com passagens contundentes que consegue levar o leitor às lágrimas em diversos momentos. | Compre.

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Monstress, de Sana Takeda e Marjorie Liu
(Pixel)

Complexa, imaginativa e escatológica, o título flerta com diversos limites dentro do mercado em que atua. Escrita e desenhada pelas artistas Marjorie Liu e Sana Takeda, a história fala de Maika Halfwolf, uma arcânica que foi mutilada pela guerra e que esconde um poder desconhecido. A arte tem um tom barroco que agrada por ser diferente de quase tudo que lemos nos comics hoje em dia. Além disso traz muitos elementos de mangás de fantasia, ilustrações cyberpunks dos anos 1990 de revistas como Heavy Metal. | Compre.

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Sem Volta, de Charles Burns
(Quadrinhos na Cia/Companhia das Letras)

A trilogia épica de Charles Burns foi reunida em um só volume pela Companhia das Letras. A HQ traz uma viagem pelo universo sombrio e delirante do autor para falar de memória, passado e de como os traumas também nos definem. O autor fez uma narrativa existencialista com ares autobiográficos, mas se apoiou em duas estéticas aparentemente díspares, os gibis pulp de romance dos anos 1950 e as aventuras à la Tintim. Um trabalho meticuloso com uma história muito bem contada que reafirma Burns como um dos principais autores dos quadrinhos americanos. | Compre.

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Graphic MSP – Jeremias: Pele, de Rafael Calça e Jefferson Costa
(Panini)

A reinterpretação de um dos raros personagens negros das histórias da Turma da Mônica tornou-se um best-seller em 2018, o que reforça a necessidade de termos mais trabalhos com boa representatividade como esse. Os autores Rafael Calça e Jefferson Costa usaram de muita sensibilidade neste gibi para falar de racismo, solidão do jovem negro, fazendo deste um dos mais contundentes trabalhos do selo Graphic MSP. O gibi também fala de superar adversidades e tem um corpo de coadjuvantes bem escrito. Um trabalho que ressoa bastante questões da sociedade e que revela um personagem cativante. | Compre.

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A Vida é Boa Se Você Não Fraquejar, de Seth
(Mino)

O autor canadense Seth parte em busca do paradeiro de Kalo, um cartunista obscuro que trabalhou na New Yorker nos anos 1950 e cujo paradeiro é desconhecido. Como um obcecado por cartunistas de jornais do século 20, Seth começa a seguir rastros desse autor desaparecido, o que serve de ponto de partida para a HQ. Misturando ficção e realidade (Kalo é um autor inventado), Seth usa o mote da investigação para fazer uma viagem que mistura memórias com reflexões existenciais, sempre com doses de pessimismo. | Compre.

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Visão Vol 1 – Pouco Pior Que Um Homem, de Tom King e Gabriel Hernandes Walta
(Panini)

Curioso como a saturação do gênero super-heróis nos quadrinhos esteja criando novas obras mais inventivas. A mesma indústria que se fagocita em busca de reformulações, crises, sagas longas, recauchutes e retornos, também abre espaço para ideias originais como esse Visão. Imaginando o famoso sintozóide membro dos Vingadores como um pacato pai de classe média suburbano dos EUA, King fez diversos comentários sociais através de uma paródia tanto dos supers quanto do modo de vida americano. | Compre.

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Fugir – O Relato de um Refém, de Guy Deslile
(Zarabatana)

É praticamente impossível abandonar a leitura dessa HQ após começar a ler. O canadense Guy Delisle fez uma narrativa envolvente para falar do cotidiano de Christophe André, um voluntário de uma ONG médica que foi sequestrado e mantido em cativeiro quando trabalhava na região do Cáucaso. O tom minimalista do desenho, a possibilidade da morte que paira sobre a trama e a crueza do testemunho fazem dessa obra uma experiência árdua. | Compre.

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11
Conto de Areia, de Jim Henson
(Pipoca e Nanquim)

Ao dar vida ao roteiro de Henson, por si só incrivelmente imaginativo, Peréz teve o desafio de criar um trabalho que fizesse jus ao seu criador original, mas que também fosse além. O resultado foi uma viagem surrealista e cheia de inovações estéticas e narrativas que transformaram esta HQ em um dois mais belos trabalhos do quadrinho autoral americano. O resultado desse esforço rendeu dois prêmios Eisner, dois Harvey e uma aclamação da crítica como há muito não se via para um álbum em quadrinhos nos EUA. | Compre.

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Gideon Falls, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino
(Mino)

Jeff Lemire é um autor prolífico, indo do mainstream (Velho Logan, Surpreendentes X-Men, Black Hammer) ao autoral (Condado de Essex, Nada a Perder). 2018 foi o ano em que os leitores brasileiros tiveram acesso às diversas facetas do autor. Mas, de longe, a mais ousada é Gideon Falls, série de sucesso lançada pela Image nos EUA e que chega quase simultaneamente ao Brasil. Trata-se de uma obra de horror com uma carga dramática que vai se tornando tóxica e perturbadora à medida em que a história avança. O enredo fala de um misterioso celeiro sobrenatural que aparece para algumas pessoas e que as fazem perder o juízo. Desafiando os limites da loucura e da razão, Lemire e Andrea Sorrentino criam uma obra com muitas camadas e uma narrativa inventiva que explora as possibilidades do desenho, dos requadros, tornando a história tão envolvente quanto angustiante. | Compre.

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Mort Cinder, de Hector Oesterheld e Albert Breccia
(Figura)

Uma das mais importantes obras do quadrinho argentino finalmente chegou ao Brasil. Mort Cinder, escrito por Héctor Oesterheld e com arte de Alberto Breccia, a HQ foi vanguardista e trouxe elementos que influenciariam diversos artistas em todo o mundo. Lançada originalmente em 1960, o livro teve sua edição brasileira viabilizada por financiamento coletivo. Usando a técnica conhecida como chiaroscuro, em que se explora as possibilidades do contraste do preto e branco no papel, Breccia trouxe expressões até então impensáveis para os quadrinhos até aquele momento. A história do personagem-título que não envelhece traz coadjuvantes complexos e uma trama que até hoje soa ousada e experimental. Claramente um dos clássicos dos quadrinhos mundiais que chega por aqui em uma edição à altura de sua importância. | Compre.

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QP, de Powerpaola
(Lote42)

A quadrinista e artista plástica equatoriana Powerpaola faz de QP sua HQ mais intimista e experimental. Com um traço que desafia convenções ela traz uma narrativa intimista ao mesmo tempo em que explora suas impressões das cidades em que viveu, sempre com muita vulnerabilidade. Enquanto sua HQ Vírus Tropical tratava das relações familiares, essa HQ narra a sua relação com seu companheiro e foi feita ao longo de vários anos. Entre os temas refletidos pela autora em seus desenhos estão a sexualidade, feminismo, identidades culturais e a solidão do indivíduo nômade. | Compre.

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A Revolução dos Bichos, de Odyr
(Companhia das Letras)

O quadrinista Odyr fez uma adaptação com muita personalidade de A Revolução dos Bichos, clássico da fábula política escrita por George Orwell em 1945. Com uso da tinta acrílica, o autor escancara o desconforto da leitura e faz de cada página uma obra de arte própria. A HQ ganha ainda mais impacto quando relacionamos essa alegoria dos animais de uma fazenda com a recrudescimento do autoritarismo do Brasil atual. | Compre.

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A Arte de Charlie Chan Hock Chye, de Sonny Liew
(Pipoca e Nanquim)

Boicotada em sua terra natal, Singapura, A Arte de Charlie Chan Hock Chye, de Sonny Liew é uma das mais importantes HQs desta década, tanto pela inovação trazida pela narrativa quanto por sua coragem em desafiar a história oficial de seu país. A HQ traz a biografia de Hock Chye, um artista de 80 anos que sempre foi visto como um dos maiores autores de quadrinhos do Sudeste Asiático. Famoso por suas histórias de aventura e ação, ele escondeu mensagens que traziam críticas ao regime autoritário que sempre governaram o país. Mas, à medida em que avançamos na leitura descobre-se que Hock Chye é um personagem inventado. Sonny Liew passa a questionar a noção do real quando o assunto é a dominação do imaginário de uma sociedade. Com um traço versátil e um uso incrível do design de páginas, essa HQ é um dos mais sofisticados projetos de quadrinhos nos últimos tempos. | Compre.

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O Perfeito Estranho, de Bernie Kringstein
(Veneta)

O Perfeito Estranho reúne as principais HQs produzidas nos anos 1950 pelo americano Bernie Krigstein, um autor cuja influência seria percebida nos anos seguintes através de nomes como Frank Miller, Daniel Clowes, Chris Ware e Art Spielgeman. Krigstein foi visionário em uma época em que os comics eram vistos apenas como negócio, com pouco espaço para que os autores desafiassem as convenções da indústria. O autor trouxe como contribuição uma narrativa de cunho psicológico para os comics, trazendo mais nuances para a história. Seu trabalho mais conhecido é Raça Suprema (inclusa nesse volume), que traz uma página sem palavras ou diálogos em que a tensão é marcada pela sequência da arte sequenciada. Somente essa página já seria suficiente para exemplificar a influência do autor, mas esse volume lançado pela Veneta mostra que sua importância ultrapassa esse clássico. A edição traz ainda quase 60 páginas de artigos contextualizando a relevância de Kringstein. | Compre.

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A Terra dos Filhos, de Gipi
(Veneta)

O italiano Gipi imaginou um futuro catastrófico para a humanidade. Mas, ao contrário de muitos outros autores que pensam o futuro distópico a partir da degradação do meio ambiente ou da dominação desta ou daquela tecnologia, Gipi imagina um mundo destruído pela inabilidade social, um lugar hostil e perigoso que foi fruto de nossa incapacidade de ter empatia com o próximo. A referência ao nosso momento atual, mediado por telas e redes sociais, é instantâneo. Mas a HQ vai além. Trata de masculinidade (e suas fragilidades), paternidade e a importância do amor. A arte de Gipi é bastante expressiva e faz usos de longas passagens em silêncio para retratar um mundo destruído onde um pai tenta criar seus dois filhos da maneira mais bruta possível como forma de sobrevivência. | Compre. 

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Eles Estão Por Aí, de Bianca Pinheiro e Greg Stella
(Todavia)

Eles Estão Por Aí é um livro insólito, de difícil penetração e cuja narrativa busca sempre os lugares menos óbvios. Criaturas disformes que não lembram nada do que já vimos antes entram em uma jornada por lugares esquisitos onde encontram seres ainda mais estranhos. Com essa trama, aparentemente simples, Greg Stella e Bianca Pinheiro criam um dos trabalhos mais assombrosos e desafiadores dos quadrinhos nacionais. É a encarnação em forma de gibi do estranhamento que temos ao nos depararmos com a arte contemporânea, com sua interpretação aberta e cuja maior intenção é dialogar afetivamente com o observador. Um trabalho que ainda deverá ganhar novas leituras nos anos seguintes. | Compre.

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A Entrevista, de Manuele Fior
(Mino)

Em A Entrevista, o italiano Manuele Fior novamente reflete sobre os relacionamentos, mas dessa vez fazendo uma análise mais social: questiona os conflitos geracionais e como a tecnologia modificou o modo como nos relacionamos. Ele usa analogias para criticar as redes sociais e os distanciamentos causados pelas relações mediadas por algoritmos. Mas vai além. Costurando os diversos elementos visuais, o leitor de A Entrevista se vê imerso em uma obra com diversas interpretações e sem solução. É um trabalho bastante meticuloso que discute temas grandes como passagem do tempo, relações humanas, tecnologia, tudo conduzido por um autor com um domínio habilidoso das possibilidades criativas das HQs. | Compre.

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Ayako, de Osamu Tezuka
(Veneta)

Este clássico do japonês Osamu Tezuka trata da violência que foi a transformação japonesa após a rendição na Segunda Guerra Mundial e debate temas como sexismo, tradições e corrupção. A história traz temas como política, luta de classes, além de tecer críticas do tratamento dado ao país pela comunidade internacional. É impressionante a versatilidade de Tezuka para atuar em diversos gêneros, sempre com um estilo muito próprio: traço simples e emoções exacerbadas. Lançada originalmente em 1972 na revista japonesa Big Comic, esta é a primeira vez que a obra sai no Brasil. Tido como o “deus do mangá”, Osamu Tezuka trouxe inovações estéticas e narrativas, mas uma de suas maiores contribuições, sem dúvida, foi a sensibilidade que tratou de temas de seu próprio tempo. Parte dos acontecimentos mostrados nessa HQ foram vivenciados pelo autor, cuja carreira iniciou logo após a rendição do Japão. Por isso nesta e em várias outras obras há um tom de indignação em relação à guerra. Tezuka sempre militou em tornar o mangá um veículo inovador, que pudesse se comunicar com todos os públicos e abordar os mais diversos temas. Ayako é prova disso. | Compre.

Anteriores:

* Os textos desta lista trazem excertos de resenhas publicadas ao longo do ano aqui na Revista O Grito!.