Os 30 Melhores Discos de 2016

topdiscos

Textos e edição de Paulo Floro e Fernando de Albuquerque.

Em um dos anos mais complicados pra geral (golpe no Brasil, eleição de Trump, escalada de ódio), a música provou que é um dos melhores veículos para levantar debates sociais importantes. Violência policial, solidão da pessoa negra, ativismo trans, meio ambiente, racismo, a música em 2016 documentou essas e outras questões em discos que quebraram barreiras em seus gêneros. Este foi também um ano de muita inovação, diversidade (no caso da música brasileira, sobretudo).

Listas são sempre controversas e por isso são tão interessantes. Com apenas 30 posições muita coisa teve de ficar de fora, mas acreditamos que esse Top representa bem o ano que passou. E mais uma vez defendemos nossa proposta de unir brasileiros e estrangeiros num mesmo balaio, porque, você sabe, música é música.

É isso: valeu mesmo a todo mundo que acompanhou a nossa cobertura musical este ano. Todos as posições acompanham links para serviços de streaming (Youtube, Spotify, etc). Bom play!

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James Blake – The Colour of Anything

“Blake traz suas questões pessoais, com um leve toque de melodrama, para um campo da música eletrônica moderna – que domina como poucos. É um disco bem depressivo, confessional como nunca e, ainda que soe irregular em sua longa duração, reflete um artista no auge da sua criatividade e sensibilidade. Ficamos curiosos para o novo Blake que vai sair dessa catarse pessoal que é The Colour In Anything“. [Paulo Floro] Leia a resenha. | Ouça.

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Kendrick Lamar – untitled unmastered.

Um ano depois de lançar um dos maiores clássicos do hip hop (dizemos isso sem medo), Kendrick Lamar entrega outro disco inspirado. O rapper pegou canções tocadas em apresentações e participações especiais ao vivo e as gravou para garantir que ficassem para a posteridade com a importância que merecem. Aqui ele trata dos mesmos temas que fizeram de To Pimp A Butterfly um dos mais importantes registros sobre a situação da comunidade negra nos EUA, como a violência policial e o racismo institucionalizado. [PF] | Ouça.

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Barro – Miocárdio

A música feita em Pernambuco esteve bem diversificada em 2016. Barro é uma prova disso. Miocárdio, a estreia solo do vocalista Filipe Barro do Bande Dessinée, traz o cancioneiro da América Latina e do Nordeste dialogando com o pop global. É um disco cheio de texturas, sotaque e referências cosmopolitas com desejo de fazer conexões com diversas sonoridades de diferentes partes do mundo. “No meu disco acho que o principal é esse diálogo com a música pop global, a música brasileira, a minha ligação com a música nordestina e esse contexto pernambucano. Eu não gosto de me prender a gênero, então cada música é uma tentativa de propor novas conexões sonoras, procurando mostrar uma perspectiva diferente pra coisas que estão pulsando, disse Barro em entrevista para a Revista O Grito!. | Ouça.

pablo

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Kanye West – The Life of Pablo

Kanye West cultivou ao longo dos últimos anos uma persona controversa, hoje perigosamente repulsiva, dada sua aproximação e admiração por Donald Trump. Mas é inegável o seu talento em criar arranjos e letras que superam expectativas e que o colocam em uma posição isolada no rap mundial hoje. The Life Of Pablo traz inovações em relação aos seus trabalhos anteriores, sobretudo no passeio que faz pelos gêneros gospel (“Ultralight Beam”) e soul (“Fade”). Ególotra ao extremo, o disco é basicamente sobre o próprio Kanye e o modo como lida com aspectos de sua vida e do showbiz, incluindo até indiretas para outros nomes do pop, o que é bem baixo dada sua estatura hoje no cenário musical. Ainda assim é um trabalho que revela um músico ainda no auge criativo e disposto a experimentar. [PF] | Ouça.

hval

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Jenny Hval – Blood Bitch

A sexta faixa de Blood Bitch, com seu diálogo, são as notas explicativas que melhor definem o conteúdo do disco. Discutindo feminismo, empoderamento, menarcas e repressão sexual a norueguesa Hval traça uma sinfonia que dialoga diretamente com os temas que circundam o vampirismo e toda a simbologia que rodeia a história destes seres “míticos”. Cheio de referências literárias e cinematográficas, Blood Bitch traz uma sonoridade muito particular com respiros, sussurros e sons ambientais que fazem o ouvinte “mergulhar nas profundezas” da própria cantora. [FA] | Ouça.

Capa - Mahmundi (w)

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Mahmundi – Mahmundi

Eletrizante. Esse, talvez, seja o melhor adjetivo para identificar Marcella Vale, a Mahmundi. Com tom melancólico e intimista, cada faixa do seu disco homônimo nasce, cresce e finda no ouvido como um delicado exercício de exposição de sentimentos. São versos que hora são doces, hora são amargos, fazendo com que ela nos guia por uma viagem idílica que conforta e perturba. [FA] | Ouça.

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Kaytranada – 99,9%

Produtor e compositor de grandes artistas o haitiano Kaytranada expande sua própria personalidade e sonoridade em seu álbum de estreia. Ele leva as experiências musicais às últimas consequências testando suas próprias capacidades e brincando com rimas, vozes e arranjos. Neste álbum ele constrói sua identidade musical autônoma sem estar vinculado à produção para outros artistas e convida diversos músicos e intérpretes para cantar com ele, tais como Aluna George, Vic Mensa, Little Dragon e o Anderson .Paak. Destaque para a apropriação que fez da tropicalista “Pontos de Luz” em “LITE SPOTS”, escrita por Waly Salomão e Jads Macalé e sampleada aqui na voz de Gal Costa. [FA] | Ouça.

rashid

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Rashid – A Coragem da Luz

“Entre as maiores inquietações de Rashid estão a solidão trazida pelas redes sociais, a intolerância (machismo, racismo) cada vez mais forte embalados em um discurso de ódio, além das injustiças ainda cometidas no País aos negros e moradores das comunidades. Já tínhamos percebido essa voz lírica do rapper no lindo clipe e single “A Cena”, lançado ainda ano passado. Com um free jazz melancólico ao fundo ele questiona a violência policial e expõe a falta de saída dos jovens negros hoje nas favelas. “O que fizemos aos senhores, além de nascer com esta cor/ e de sorrir lindamente diante de nossa amiga, dor?”, canta Izzy Gordon em uma participação especial na canção”. Leia a resenha. [PF] | Ouça.

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22
Rihanna – ANTI

Este é de longe o melhor trabalho de Rihanna em anos. O consenso popular de que o tempo é o melhor remédio serviu bem para a construção conceitual dessa nova fase de Rihanna. Depois de sete trabalhos consecutivos, lançados anualmente, esse foi o maior período de pausa entre seus discos. Não por acaso, esse disco estabelece um registro mais underground e introspectivo, brincando com texturas vocais e arranjos cuidadosamente desarrumados. Muito dessa mudança de sonoridade deve-se às parcerias que a cantora agregou, incluindo rudimentos de uma atmosfera R&B mais experimental. Leia a resenha. [Josafá Santana] | Ouça.

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Nick Cave and The Bad Seeds – Skeleton Tree

Melancolia, consumação e uma espécie de aura depressiva sempre consumiu Nick Cave nos discos que gravou ao lado dos integrantes do Bad Seeds. Tanto quanto a tristeza, os sons eletrônicos sempre ocuparam espaço de destaque na discografia de Cave e estão bem mais presentes neste disco. Ora silencioso, ora turbulento Skeleton Tree nos fala sobre tudo aquilo que vivemos ao longo da vida: separação, saudade, morte e culpa. E isso fica bem notório em faixas como “Jesus Alone”. Ela abre os trabalhos e mantém a tônica “sadness” até o fim. Vale lembrar que a morte do filho de Cave, com apenas 15 anos, ainda durante a gravação do disco, foi um incidente que, provavelmente, deu os contornos acinzentados ao trabalho. [FA] | Ouça.

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Tássia Reis – Outra Esfera

A rapper Tássia Reis foi bastante direta em suas intenções com o ótimo Outra Esfera: quer rimar sobre a violência contra a mulher, a falta de perspectivas para o jovem negro, o preconceito de classe, mas também sobre o orgulho crespo e feminismo. E fez isso com uma das produções mais sofisticadas do rap este ano. | Ouça.

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Sabotage – Sabotage

O disco póstumo do rapper Sabotage surpreendeu. Mais do que um simples serviço aos fãs saudosos, o disco trouxe uma produção minuciosa do pessoal do Instituto, que contou com a ajuda da família do músico para tornar o trabalho bem próximo do que o próprio Sabotage teria feito. Baseado em muito material deixado pelo rapper, esse disco homônimo faz jus à memória de um dos maiores nomes do hip hop brasileiro. [PF] | Ouça.

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Anderson .Paak – Malibu

Anderson .Paak. traz referências que vão de músicos como Kendrick Lamar, Dr Dre e D’Angelo e faz suas composições passearem entre o Hip-Hop, Soul, Jazz e R&B de diferentes épocas e subestilos. O álbum conversa com as demais obras do cantor que, neste título, aprofunda ainda mais suas histórias pessoais e conflitos registrados em sua vida nas ruas de los Angeles. [FA] | Ouça.

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BaianaSystem – Duas Cidades

O BaianaSystem faz uma mistura de rock, rap e música eletrônica tendo como base elementos tradicionais da música urbana feita na Bahia. Este novo álbum debate questões problemáticas de Salvador, mas que podem ser aplicadas às grandes metrópoles brasileiras, entre elas a especulação imobiliária e o desapego à memória urbana. [FA] | Ouça.

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Isadora Melo – Vestuário

Novidade da renovação da cena musical pernambucana, Isadora Melo lançou seu disco de estreia, Vestuário. Sua aparição é retrato de uma renovação pela qual passa a música pernambucana, diversificada e buscando referências em diversos estilos e épocas. Isadora, que também é atriz, se destaca pela sua interpretação, dando leveza, peso e cadência necessárias para faixas como Pequena”, “Ave d’alma” e “Partilha”, esta última presente no EP lançado em 2014. É um disco que valoriza a canção, o que é reforçado pela formação acústica da banda, sem percussão, mas muito bandolim. Um dos mais belos trabalhos do ano. Veja a resenha que fizemos de Isadora. [PF] | Ouça.

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15
Hurtmold e Paulo Santos – Curado

A banda Hurtmold sempre foi conhecida pela inventividade e por nunca estar à vontade em relação às convenções do som em que trafegam, no caso a música instrumental. Agora o grupo de jazz contemporâneo encontra um dos principais nomes da música mineira, Paulo Santos, novo disco, Curado. Um dos discos de música experimental mais interessantes do ano. [PF] | Ouça.

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Blood Orange – Freetown Sound

Devonté Haynes decidiu olhar para sua própria história e de seus antepassadas para criar este belo e pessoal disco que fala muito sobre identidade e resistência. Cheio de hits, Freetown Sound soa ora catártico, ora melancólico. [PF] | Ouça.

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13
Amaro Freitas – Sangue Negro

Sangue Negro, disco de estreia do pianista pernambucano Amaro Freitas, traz uma lufada de ar fresco à nova cena instrumental. A obra bebe no jazz, de onde emerge em composições harmonicamente ricas sem esquecer o sotaque regionalista que imprime à obra sua marca registrada. No total, Sangue Negro traz sete canções, sendo seis autorais e uma releitura do clássico de Dominguinhos, “Lamento Sertanejo”. Aos ouvidos, Sangue Negro também reinaugura uma linhagem de jazz autoral ao criar o estilo frevo-balada em ‘Subindo o Morro’. Ao contrário do RagTime, sonoridade mais próxima ao mais pernambucano dos ritmos, Amaro decompõe um frevo seu original ao envolvê-lo em um arranjo suave numa conjunção que nos remete à sonoridade de João Donato. Leia a resenha. [Iara Lima] | Ouça.

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12
Leonard Cohen – You Want It Darker

Celebrado como um dos seus melhores trabalhos, You Want It Darker acabou marcando a despedida de Cohen, que morreu este ano aos 82. Com uma profundidade que lhe é típica, o disco trata da metafísica da morte, espiritualidade e relação com Deus, o que sempre fez parte de sua música. [PF] | Ouça.

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11
Angel Olsen – MY WOMAN

Vocais delicados e sintetizadores poderosos apresentam a dualidade de Angel Olsen em My Woman“. O disco, que beira o experimental – comparado com outras obras de Olsen – mostra aos ouvintes uma nova miríade de sonoridades, circundados por temas confessionais. Aqui ela interpreta diferentes personagens, misturando vocais melodiosos e guitarras potentes. Lembra, em alguma medida, o impacto que o som de PJ Havey teve nos anos 90. [FA] | Ouça.

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10
Chance The Rapper – Coloring Book

A inovação no rap este ano girou em torno de Chance The Rapper e seu time de colaboradores, entre eles Lido, Kaytranada e seu grupo The Social Experiment. Com Coloring Book, sua segunda mixtape ele novamente experimentou diversos estilos, gêneros e arranjos que, apesar de estranhos à primeira vista, geram aquele estranhamento necessário para avançarmos em algo absolutamente novo. O disco tem flow poderoso para manter o clima seja em faixas dançantes como “No Problem” ou tratando de temas sérios como a violência policial em sua cidade natal, Chicago ou ainda sobre drogas, problemas familiares e espiritualidade. Talvez hoje o rapper que melhor se apropria das possibilidades de seu tempo, Chance construiu sua carreira sem ainda lançar um disco físico. Com esse trabalho ele tornou-se o primeiro artista indicado ao Grammy com um álbum lançado apenas para streaming. [PF] | Ouça.

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Radiohead – A Moon Shaped Pool

Pasquale D’Alessio, compositor e escritor do blog The Sound Principles escreveu (o texto foi publicado aqui na Revista O Grito! com tradução de Renata Arruda): “Então por que Radiohead importa tanto? Simples. Eles nos mostram o que significa ir além de apenas compor música. Eles nos mostram como ultrapassar os limites de uma estética intuída, como desenvolver técnicas e uma voz pessoal. Eles nos mostram que há mérito em tudo o que você ouve e que a música pode ser algo que vai além da música de fundo ou da dança. Claro, eles também fazem esse tipo de coisa, mas eles nos trapaceiam com aquele beat às vezes delinquente; com a melodia guiada pela alma, as progressões fáceis de notas, que nos levam a um mundo de melodias distorcidas, mudando constantemente de sintaxe e com uma dignidade musical descompromissada.” A Moon Shaped Pool traz músicas cultivadas pela banda ao longo de dezenas de anos e que resumem as melhores características da sonoridade do grupo. | Ouça.

anohni

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ANOHNI – HOPELESSNESS

“É bem relevante que um dos trabalhos mais importantes do ano tenha sido feito por uma mulher trans. Anohni estreia com Hopelessness, um disco que inova na música eletrônica ao mesmo tempo em que entrega diversos posicionamentos políticos importantes em tempos de uma escalada do conservadorismo. Anohni é o principal nome de uma geração que não pode mais ser ignorada, nem calada. E na estreia deste seu novo momento de vida, Hopelessness é disco ícone de um mundo urgente de mudanças”. E a música da artista e seus produtores já apontam novos rumos na música eletrônica”. [PF] Leia a resenha. | Ouça.

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Metá Metá – M M 3

O Metá Metá, formado por Juçara Marçal, Kiko Dinucci e Thiago França, faz hoje o som mais inovador da música brasileira hoje. O som dele força barreiras de ritmos bem particulares da música brasileira, em especial o samba, que os torna iconoclastas improváveis, sem deliberação. O que querem mesmo é unir metais, percussão e a voz potente de Juçara em um som que embala letras que remetem às raízes afrobrasileiras. MM3 segue o ótimo trabalho iniciado com o já clássico Metal Metal, de 2014, só que talvez um tanto mais pesado. [PF] | Ouça.

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David Bowie – Blackstar

“Com este disco Bowie criou o seu clássico desta década ao se reconectar com a sua proposta para se destacar no pop: o inusitado. Mais uma vez ele rompeu com as expectativas dos fãs e da própria indústria ao criar um trabalho ao mesmo tempo emotivo e experimental. Supera o anterior The Next Day tanto nas propostas estéticas quanto no texto, o que mostra que a escrita de Bowie nunca esteve tão criativa. Evocando cantos gregorianos, tragédias medievais e bíblicas, Blackstar é uma obra que explora diversas possibilidades, mas ainda assim é concisa em suas intenções”. Sua relevância só aumentou ao descobrirmos que este derradeiro trabalho foi feito enquanto Bowie planejava sua saída de cena – o músico morreu dias depois do álbum chegar às lojas, anunciando que esse seria um 2016 difícil para todas e todos. [PF] | Ouça.

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05
Céu – Tropix

“Se no trabalho anterior, Caravana Sereia Bloom, ela foi buscar as raízes do brega romântico, neste aqui ela decidiu catar o melhor das batidas eletrônicas, além de toques de rock psicodélico e soul, mas sempre trazendo essas referências de forma orgânica para seu estilo. Tropix agrupa inúmeras referências em busca de um hibridismo sonoro e estético que é parte inerente de Céu como artista “global”. Nas composições, Céu fez de Tropix o seu disco mais plural, buscando referências de diversos locais, como um painel pixelado. Em “Perfume do Invisível”, a mais dançante e eletrônica das faixas, ela nos lembra do mestre do quadrinho erótico Milo Manara. “Arrastarte-Ei”, com baixo de Lucas Martins, traz a cantora em uma inspiração do fantástico ao se transformar em mar. É uma canção de amor para dançar agarrado. Em “Minhas Bics” ela cria um hit dançante pegando um dos itens mais baratinhos da papelaria, mas que é também um ícone pop de nosso imaginário. Leia a resenha.
| Ouça.

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04
Frank Ocean – Blonde

Frank Ocean construiu uma carreira de uma maneira inusitada dentro da lógica da indústria do showbiz. Fechou-se em seu próprio universo, já desde seus primeiros momentos enquanto artista, e passou a alienar os fãs, o que criou um efeito contrário ao óbvio esperado: esse distanciamento só fez aumentar seu alcance. Introspectivo como poucos, Ocean é hoje um dos maiores astros do pop. Depois de estourar com o clássico ChannelOrange ele criou muitas expectativas para o seu próximo trabalho e “massacrou” fãs com praticamente nenhuma atualização durante mais de quatro anos. Então eis que, de surpresa, ele solta dois discos seguidos, Endless e este Blonde. É um disco meticuloso, cheio de camadas e repleto de ideias que parecem fugir do trivial a todo custo. Seja exagerando na voz de hélio, nos interlúdios e nos arranjos cheios de detalhes, Blonde vai em um maximalismo que soa como um diário, caótico, mas que, ao final, faz todo sentido. E é isso que Ocean nos entrega: algo tão estritamente pessoal que acaba atingindo o ouvinte como poucos cantores conseguem. E com isso ele vai desconstruindo o R&B ao seu modo, isolando-se e expondo-se ao mesmo tempo. É, com certeza, um dos mais importantes compositores/cantores de sua geração. [PF] | Ouça.

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03
Beyoncé – Lemonade

Beyoncé criou o disco mais importante de sua carreira com Lemonade. Lançado de forma surpresa este ano o “álbum visual” trouxe para a música pop mainstream as discussões sobre violência e raça, o que acabou viralizando o debate com a música “Formation”, em que critica a atuação da polícia contra negros nos EUA. O trabalho vai fundo em busca de uma afirmação da auto-estima da população afroamericana, destacando a importância da cultura e da comunidade negra para todo o mundo. O disco também tem algo a dizer sobre empoderamento feminino, o que já era uma tônica do trabalho anterior, mas que aqui ganha uma relevância ainda maior. Atuando como produtora e compositora do disco, Beyoncé segura com afinco o peso de ser hoje a mais importante estrela da música pop no mundo (desculpem, todas). E Lemonade é hoje o seu maior clássico. (O nome do álbum faz referência ao ditado popular sobre a volta por cima que diz “quando a vida te der limões, faça uma limonada”, mas também tem a ver com o fato de alguns negros escravizados tomarem limonada com a esperança de que clareasse a pele). [PF] | Ouça.

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02
A Tribe Called Quest – We Got It From Here… Thank You 4 Your Service

O trio de rap A Tribe Called Quest demorou 18 anos para lançar um novo trabalho. Muito mudou no mundo e na música durante todo esse tempo, mas a banda chega afiada como poucas. Q-Tip, Ali Shaheed Muhammad e Jarobi White fizeram sucesso nos anos 1980 e 90 com um som politizado, mas dançante e cheio de suíngue. Agora eles retomam a mesma proposta cantando sobre as dificuldades da população afro-americana hoje. É o disco que melhor registra o lixo que foi 2016, sobretudo para quem sempre esteve à margem das benesses do capitalismo. Em algumas faixas a banda aposta em rimar o cotidiano da comunidade, em outras manda recados diretos para políticos como Donald Trump e Hillary Clinton. Há também faixas sobre violência, perseguição e o modo como jovens negros são tratados pelo Estado. É pesado como precisa ser. O grupo apurou ainda mais o seu estilo, que é ser bem direto nas letras, mas embalado com muito ritmo. O disco duplo contou com participações de peso como Kendrick Lamar, Jack White, Andre 3000, Kanye West, Elton John e atingiu o primeiro lugar em vendas na semana de lançamento. [PF] | Ouça.

solange

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Solange – A Seat At The Table

Grande parte da produção musical de 2016 tratou de temas atuais e, mais especificamente, da situação do negro no mundo hoje. Mas foi Solange quem deu voz à questão racial de um ponto de vista bem pessoal, o que soou ainda mais contundente que o debate no campo político e social (o que Kendrick Lamar, A Tribe Called Quest e Beyoncé, entre muitos outros, fizeram muito bem). Solange falou da solidão e invisibilidade da mulher negra (“Cranes In The Sky”), racismo (“Weary”), autoestima (“Don’t Touch My Hair”) e raiva (“Mad”) entre outros assuntos, deixando claro a importância da representatividade para tratar de temas importantes.

As composições abusam de ironia, alegorias e lirismo para falar de temas que são duros, mas necessários. Para marcar ainda mais esse disco como um documento contra o racismo ela ainda incluiu interlúdios que contam episódios de sua família, como o preconceito que seu pai sofreu na adolescência (“Dad Was Mad”) e quando sua mãe fala sobre o fato dos brancos sempre questionarem a necessidade da celebração da cultura negra, a velha falácia do racismo reverso (“Tina Taught Me”).

Pegando referências na sonoridade do R&B noventista, jazz e soul, mas também da eletrônica, Solange fez um disco de batidas cadenciadas e calmas, mas cujo tema emana raiva, urgência e grito, o que faz dele um álbum clássico e necessário para todxs nós. [PF e FA] | Ouça.

MELHORES DE 2016
Top 25 Clipes
Top 30 Quadrinhos

MELHORES DISCOS: ANTERIORES
Melhores de 2011 (Kaputt, de Destroyer em 1º, além de Marcelo Camelo, Kanye West e Wado)
Melhores de 2012 (ChannelOrange, de Frank Ocean em 1º, além de Siba, Céu, Grimes e Fiona Apple)
Melhores de 2013 (Settle, de Disclosure em 1º, além de Arcade Fire, Rodrigo Amarante e Passo Torto)
Melhores de 2014 (RTJ 2, do Run The Jewels, em 1º, além de FKA twigs, Mombojó e Lucas Santtana)
Melhores de 2015 (A Mulher do Fim do Mundo, de Elza Soares em 1º, além de Kendrick Lamar, Karina Buhr e Jamie xx)