Crítica-Teatro: Opera D’Água reflete sobre o drama da escassez no Nordeste

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Colapso da Barragem de Jucazinho inspirou a montagem (Foto: Danilo Leal/ Talita Rodrigues/ Divulgação).

Da Revista O Grito!, em Surubim

Motivado pelo colapso da Barragem de Jucazinho e do convívio da população com o racionamento de água, o espetáculo Ópera D’Água, encenado pelo Grupo Proscênio, estreou no fim do ano passado, em Surubim, município do Agreste de Pernambuco. É a última peça da trilogia Saga Cantada de Ar, Terra e Água – Trilogia Dramática para o Homem e o Espaço, que busca discutir a relação do homem com três espaços de sua natureza vital: ar, terra e água.

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A Barragem de Jucazinho, principal responsável pelo abastecimento na região, está com o pior volume da história, de acordo com Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa). Para se ter uma ideia, 11 municípios do Agreste convivem com 29 dias sem água e apenas um com abastecimento.

A água permeia toda a encenação e o elenco interage com tonéis, baldes, bacias, garrafas, canos, entre outros objetos. Cheia de efeitos sonoros, a história se passa na fictícia “Aqui”, em referência à própria Surubim. Retrata-se a vida caótica em meio ao individualismo, nervosismo, confusão; a exploração dos trabalhadores pelos poderosos; processos de disputa por lucro, poder; cooptação, corrupção e alienação. Assim, conta-se a história de como os seres humanos exploram recursos naturais e pessoas como se fossem infinitos.

Em cena, os atores logo mostram que cantam, representam e tocam instrumentos, características de artistas que desenvolvem diversas habilidades para conquistar o público. Os artistas representam diferentes papéis, com figurinos de Paulo Ricardo. Opera D’Água leva ao palco instrumentos tocados ao vivo (guitarra e acordeão), que criam uma base para que os atores possam criar possibilidades cênicas para deliciar a plateia num trabalho que une reflexão e diversão.

“O trabalho artístico/pedagógico, criativo e colaborativo do grupo consiste no exercício dos atores das próprias experiências cotidianas de relação com a água e a falta dela”, observa o diretor André Chaves, que imprime um tom provocador à montagem da peça. Chaves também atua e comanda o elenco formado por Aldeny Cardoso, Anderson Geraldo, Antônio Ferreira, Brenno Kayo, Igor Lopes, Thomás Sobral e Marcílio Moraes. Este último é o responsável pelo texto do espetáculo.

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A partir da interação com o público, o grupo acentua a possibilidade de reflexão, evidenciando contradições humanas e provocando uma abordagem sobre o tema de forma contundente. O tratamento do assunto em Opera D’ Água extrapola o drama vivido pela população do Agreste, visto que a escassez de água pode gerar disputas mundo afora. Apesar da quantidade de água disponível ser constante, a demanda crescente em razão do aumento da população cria um cenário de incertezas e conflito. O público pode conferir quatro apresentações nos dias 9,10, 16 e 17 de dezembro do ano passado, em Surubim, e a expectativa é de que a peça circule em outras regiões do Estado em breve.

A peça celebra os dez anos de criação do Grupo Proscênio do Sesc Ler Surubim, responsável pela concepção e criação coletiva do espetáculo. O grupo desenvolve trabalhos de montagens, pesquisas e ações formativas na região, preparando artistas como atores, diretores, produtores, entre outros, em novos estudos e experimentos, em novas propostas de encenação.