Crítica: Mike Patton | Mondo Cane

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AS MIL FACETAS DE MIKE PATTON
Viciado em trabalho, o vocalista do Faith No More chega à Itália dos anos 50 em novo trabalho

Por Lidiana de Moraes
Colaboração para a Revista O Grito!, em Porto Alegre

Muitas verdades podem ser ditas sobre Mike Patton, mas associar a palavra tédio ao nome do músico americano é algo que só aconteceria se uma piada de mau gosto fosse contada. Desde os anos 1980 quando ficou conhecido como o vocalista do Faith No More, passando pelo fim do grupo em meados dos anos 1990 e até o grande revival que começou em 2009, Patton se dedicou a uma lista infindável de projetos que se estendem da música instrumental a trilhas sonoras e dublagem de videogames. Apesar da variedade das criações daquele que chegou a receber o apelido de “1000 vozes”, não é possível afirmar que sua carreira consegue agradar a todos os gostos. Para entender as paranóias musicais de Patton é preciso também ser bastante paranóico.

Entre todos os trabalhos do cantor, o FNM figura como o mais aceitável comercialmente. Durante anos a reunião com Roddy Bottum, Mike Bordin e Billy Gould parecia ser adiada mais por vontade do vocalista do que em função dos desejos dos outros membros. Para Patton, a banda que fez sucesso com Epic e From Out of Nowhere, não era exatamente o que ele tinha em mente quando o assunto era música. Depois do ponto final na trajetória do FNM em 1998, ele passou a se dedicar a projetos que falavam mais de perto ao coração, como o Fantomas e o Mr. Bungle. No entanto, nenhum desses trabalhos era muito bem visto pelas gravadoras que ainda tinha a esperança de poder lucrar com a imagem do roqueiro meio pirado que levou as meninas a loucura no Rock in Rio 2, disputando com Axl Rose o posto de muso de uma nova geração do rock que se disseminava no fim dos 80.

Para resolver o impasse com os executivos que torciam o nariz para o experimentalismo de discos como Director’s cut, Delírium Córdia e Pranzo Oltranzista, a solução foi criar a própria gravadora, a Ipecac Recordings. É a partir dessa usina musical que Patton dá vazão a todas as suas loucuras. Depois de mexer até com hip hop, não é nada estranho saber que o músico fez um disco de regravações de clássicos da música Italiana dos anos 50.

A idéia para Mondo Cane surgiu em 2008. Patton, que era casado com um italiana e proprietário de uma casa em Bologna, não apenas desenvolveu um italiano perfeito como também um interesse profundo pelo cancioneiro do país da bota. Não bastava admirar Ennio Morricone (um dos últimos lançamentos da Ipecac é uma compilação do melhor do compositor de trilhas sonoras). O trabalho feito ao vivo com uma orquestra de 65 pessoas explora os gostos mais peculiares do californiano. Durante um bom tempo, os fãs puderam se divertir no You Tube com as imagens dos shows que deram origem ao disco. Bom tempo mesmo… a primeira data para o lançamento da gravação de Mondo Cane era 2008, depois passou para 2009 e, finalmente, ocorreu apenas em 2010.

Ainda na época do Faith No More, o vocalista costumava dizer que se importava mais com a sonoridade das músicas do que com o significado que colocava nas letras que escrevia. Mondo Cane com seu repertório de regravações comprova que o talento de Patton está na capacidade de criar sons através de sua voz que exprime toda a personalidade de um músico que realmente acredita nos trabalhos que faz. Por ser viciado em trabalho, Mike chegou a pecar pela pressa de produzir em alguns de seus trabalhos, mas a demora para o lançamento de Mondo Cane pode ser vista como um cuidado extra com uma obra bem executada.

Entre as 11 canções que fazem parte do álbum, há momentos sentimentais e singelos como “Scatinella” e “Deep Down”, única canção em inglês, mas que não destoa das outras por se tratar de uma composição feita por Morricone para o filme Perigo: Diabolik. No entanto, os pontos altos de Mondo Cane estão nas faixas em que Mike Patton extravasa sua energia, como na pitoresca “Che Notte!”, de Leo Chiosso e na tempestuosa “Urlo Negro”, originalmente do The Blackmen.

Mondo Cane proporciona uma experiência singular para o ouvinte e apresenta uma nova faceta de Mike Patton, igualmente talentosa, mas mais comedida. Contudo, não é para esperar que os fãs se apaixonem pela música italiana da mesma forma como um dia se apaixonaram por The Real Thing e Angel Dust. Mondo Cane é mais um trabalho de Patton e não um tributo para os clássicos italianos.

MIKE PATTON
Mondo Cane
[Ipecac, 2010]

NOTA: 8,0