Crítica: Lily Allen traz canções dolorosas adornadas por um pop manso

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Em 2014, após cinco anos de um longo hiato, a britânica Lily Allen surpreendeu os fãs e o público com o lançamento de Sheezus. Repleto de elementos tão presentes na música mainstream do momento, o então terceiro registro de estúdio da cantora brincou com os usos excessivos de autotune, como no single “Hard Out Here”, flertou com o hip hop e com a música eletrônica, além de trazer composições ácidas sobre o cenário da música pop. Ainda que tão encorpado e com uma ótima proposta, aquele trabalho em nada lembrava da qualidade e do caráter inventivo presentes nos dois registros anteriores da britânica.

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Porém, com o lançamento de No Shame (2018), novo álbum lançado mês passado, é possível ter uma dimensão da turbulência vivida por Lily na época do último disco. Complicações na vida amorosa, o trabalho excessivo e o tempo longe da família, principalmente da filha, são expostos nos 51 minutos de audição do álbum. São confissões dolorosas em que Lily parece se sentir na obrigação de revelar ao público, ou de externalizar o que há tanto tempo a machucava.

Diferente do trabalho anterior, no novo registro, Allen consegue ser coesa com a proposta do disco. Mantém muitos dos elementos apresentados no terceiro álbum, porém, dessa vez, de uma forma assertiva. O primeiro single “Trigger Bang”, em parceria com o rapper Giggs, mostra um bom uso do rap sem soar caricato para uma cantora branca, além de trazer uma atmosfera nostálgica e as confissões obscuras vividas durante a adolescência e a vida adulta da cantora.

Por apresentar composições amargas das próprias experiências de Lily, as canções que compõem No Shame transitam numa atmosfera ingênua. São canções discretas e de batidas contidas. Tudo é devidamente dosado. Canções que caminham numa linearidade mansa e isso se torna a principal base criativa sonora deste disco. Algumas das faixas poderiam facilmente se encaixar numa trilha sonora de qualquer joguinho eletrônico, como no dubstep de “Pushing Up Daisies”.

Por outro lado, há momentos em que é difícil não fugir da sensação soturna em que Allen teve de passar. “Family Man”, “Apples” e “Three” é o trio agridoce do disco. Ainda que as composições falem de assuntos dolorosos, há uma preocupação em manter uma suavidade nos arranjos.

As 14 canções do novo disco de Lily Allen pouco se diferenciam uma das outras. Soam como se a cantora e sua equipe preferissem manter as mesmas tonalidades e cores em cada faixa, como uma base para o extenso monólogo do que ocorreu nos últimos anos de Lily Allen antes do lançamento do recente trabalho. Porém, No Shame consegue retomar os deslizes e os erros de Sheezus e consertá-los. É um registro delicado, frágil em alguns momentos e adocicado em outros. Um álbum que corresponde muito bem com a qualidade e a e o caráter inventivo já estabelecido na pequena discografia da britânica.

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