Crítica – HQ: Autocracia, de Woodrow Phoenix

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Fotos: Divulgação/Veneta.
Fotos: Divulgação/Veneta.

HQ Autocracia mostra o lado trágico da obsessão pelos carros

Por Paulo Floro

Woodrow Phoenix ainda é pouco conhecido no Brasil, mas é um dos nomes mais aclamados da nova geração de quadrinistas. A editora Veneta lança no Brasil seu livro mais aclamado até agora,Autocracia (Rumble Strips no original), onde ele traz um ensaio em formato de quadrinhos para falar da obsessão da sociedade moderna com os carros.

Trata-se de um manifesto contra o impacto negativo que o carro tem em nossa vida cotidiana. Mas a obra bem que poderia se chamar “Como se livrar de um assassinato com um carro”. Usando dados do Reino Unido, Phoenix mostra o clima de impunidade institucionalizado quando motoristas matam alguém no trânsito. Atualizando para dados aqui no Brasil, o caso não é diferente. Muitas vezes o julgamento leva apenas à perda do direito de dirigir por um período determinado. Já o dano, a morte de alguém, isso não tem como ser revertido. E, à medida em que aumenta a frota no Brasil, crescem também os acidentes.

Phoenix também critica como as grandes cidades acabaram evoluindo para uma autocracia, ou seja, toda a evolução da infraestrutura se deu para acomodar os carros nas ruas e não as pessoas. Um caso bem claro são as passarelas de trânsito, abundantes também aqui no Brasil. Para não melindrar motoristas e atrasar o tráfego, essas elevações forçam os pedestres a saírem de seu caminho e se arriscarem nessas estruturas de metal ou concreto que passam por cima da via ou em galerias subterrâneas.

A HQ ainda constrange donos de utilitários e SUVs. Realmente, em uma metrópole onde a velocidade raramente ultrapassa os 60Km/h qual a utilidade de se dirigir um carro que mais parece um tanque de guerra e que alcança altas velocidades. O sentimento de poder é uma explicação plausível levantada pelo autor. A obra deveria ser indicada a todos os candidatos em autoescolas para ser leitura obrigatória antes de tirar carteira de motorista.

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Não são poucas as intersecções que podemos fazer com a situação aqui no Brasil. No Recife, por exemplo, a agenda política dos últimos oito anos se pautou pela melhoria da mobilidade. No entanto, as estratégias foram aumentar o espaço para carro, com novas avenidas, vias e viadutos. Um movimento contrário expõe falhas nesse tipo de urbanização, como o aumento da insegurança, acirramento das diferenças sociais e maior risco de acidentes.

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Phoenix faz isso de uma maneira esteticamente rica e articulada. Em suas reflexões cheias de dados e fatos levantados, ele traz uma narrativa experimental, um trabalho gráfico que encontra poucos pares nos quadrinhos. E trata da relação de pessoas e carros sem usar uma única imagem de pessoa nem de carro. É um daqueles livros que saímos modificados – perturbados e modificados.

Foto: Divulgação.
Foto: Divulgação.
AUTOCRACIA
De Woodrow Phoenix (texto e arte)
[Editora Veneta, 192 págs, R$ 44,90]
Tradução: Letícia de Castro

8,0

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