Crítica: Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro

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Foto: Divulgação/Vitrine Filmes.
Foto: Divulgação/Vitrine Filmes.

A descoberta do primeiro amor sem clichês

Por Luiza Lusvarghi

A abertura do filme, na piscina, engana. Apesar dos diálogos do tipo ‘fala muito explicadinho’, o filme Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro, explora com maestria e sutileza o universo da juventude de classe média paulistana e suas aspirações amorosas, sem jamais cair na pieguice.

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Leonardo (Guilherme Lobo) é um adolescente cego de 15 anos que enfrenta os problemas de afirmação de identidade que qualquer jovem enfrenta na difícil passagem da infância para a puberdade, porém acrescidos de todos os problemas de exclusão social inerentes a um deficiente visual. Ele quer ser independente, mas sua condição acaba por mantê-lo preso à superproteção da família, em particular da mãe. Leonardo alimenta o desejo de ter a sua primeira experiência sexual, e namorar, enquanto sonha com uma viagem ao exterior e com a liberdade. Suas aspirações são compartilhadas com a melhor amiga, Giovana (Tess Amorim). A chegada de um novo aluno na escola, Gabriel (Fabio Audi), vai despertar sentimentos contraditórios em Leonardo e Giovana.

A historia, na verdade, poderia se passar em qualquer grande cidade do mundo. O roteiro é muito bem amarrado. Ao optar por um protagonista que é um adolescente cego, Ribeiro consegue a proeza de resgatar o sentimento de pureza de um amor romântico, idealizado, e ao mesmo tempo, lançar um olhar realista e crítico sobre a banalização das relações amorosas neste contexto urbano contemporâneo.

Cego, Leonardo sofre bullying dos colegas na escola. (Divulgação/Vitrine Filmes).
Cego, Leonardo sofre bullying dos colegas na escola. (Divulgação/Vitrine Filmes).

O primeiro beijo não passa de um espetáculo a mais dentro da festinha da sala, que legitima uma hierarquia de poder através de joguinhos sensuais entre os jovens. E o bullying sofrido pelo personagem, por ser cego, e virgem, é definitivamente abordado com contornos realistas. Desta forma, embora o filme não chegue a explorar conflitos do porte do excelente seriado da MTV A Menina Sem Qualidades, pois o universo diegético da obra não questiona a estrutura escolar e social, mas se detém nas relações familiares e no ambiente vivenciado pelos adolescentes. O resultado vai muito além de um folhetim romântico sobre o primeiro amor. Mesmo porque discute a descoberta da sexualidade com naturalidade, mas com uma perspectiva narrativa cinematográfica.

As cenas mais interessantes são as da relação entre Leonardo e Gabriel ao som de “There´s Too Much Love”, de Belle & Sebastian. O diretor, um dos criadores do site Música de Bolso (musicadebolso.com.br), explora muito bem a trilha musical em favor do roteiro. Gabriel tem uma perspectiva mais pop, Leonardo ama música clássica, e as preferências musicais delineiam o perfil psicológico dos personagens, e seu universo imaginário. O longa, filme de estreia de Daniel Ribeiro, foi baseado em seu premiado curta anterior, Eu Não Quero Voltar Sozinho, de 2010.

Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (2014) participou da mostra Panorama, no 64 º Festival de Berlim, e foi eleito o melhor longa pela Fipresci (Associação Internacional de Críticos de Cinema), além de conquistar o Teddy Bear, outorgado a filmes com temática e/ou personagens gays. No 29o Festival Internacional de Cinema de Guadalajara, foi eleito, pelo público, como melhor filme.

hoje5HOJE EU QUERO VOLTAR SOZINHO
De Daniel Ribeiro
[BRA, 2014 / Vitrine Filmes]
Com Guilherme Lobo, Fabio Audi

Nota: 8,0

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