Coleção: Karate Kid, 25 Anos

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Karate Kid 3

25 ANOS DO GOLPE DA ÁGUIA
Ícone adolescente, Karate Kid foi de encontro a outros filmes da Era Reagan e segue como clássico das sessões da tarde
Por André Azenha

Quando estava lá pela primeira ou segunda série do primário, era comum no recreio os garotos disputarem o papel de Daniel San nas brincadeiras que imitavam o filme Karatê Kid – A Hora da Verdade. Afinal, todos queriam ser o sujeito desacreditado que era provocado pelos valentões, dava uma surra neles e ficava com a garota dos sonhos no final. No caso, uma loira linda, linda, linda, chamada Ali, que em nosso universo era interpretada por alguma das meninas mais paqueradas da classe.

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A história, que em 2009 comemora 25 anos de seu lançamento, todos conheciam de cor. Daniel Larusso (Raklph Macchio), jovem de uma cidade pequena, muda junto com a mãe para um município maior. Ao chegar à nova escola, logo na primeira festa na praia que vai com seus amigos recém-formados decide flertar com Ali (Elisabeth Shue), que para azar dele é a ex-namorada do valentão da escola e lutador de karatê Johnny (William Zabka), líder de uma espécie de ganguezinha de playboys.

Após apanhar de Johnny, Daniel, rapaz sensível e um tanto tímido, vai conquistando o coração da garota e é perseguido constantemente pela turma do algoz, formada por alunos da academia Cobra Kai, comandada pelo sensei inescrupuloso John Creeze (Martin Klove).

Numa dessas perseguições, depois de apanhar feio e cair inconsciente, Daniel é salvo por um velhinho simpático da vizinhança, que consertara sua bicicleta e se revela um grande lutador de karatê: Mr. Miyagi (Pat Morita). Sozinho Miyagi derrota os jovens vilões e faz um acordo com Kreeze. Nenhum dos alunos da Cobra Kai irá encostar o dedo em Daniel até a realização do torneio municipal. E para participar da competição, o bom velhinho passa a treinar Daniel e da relação mestre-aluno nasce uma grande amizade.

Karatê Kid foi o típico filme juvenil dos anos 80, parte de uma leva de produções cinematográficas que marcaram uma geração, como Curtindo a Vida Adoidadoe De Volta para o Futuro. Virou febre entre a garotada, ganhou uma linha de bonecos, desenho animado, e se transformou numa franquia.

Até Silvio Santos, sempre ele, resolveu tirar casquinha do filão, mudando, na cara de pau, o título da série televisiva “Ohara” (cujo personagem título, um veterano policial, era interpretado por Pat Morita) para Karatê Kid Ohara, sendo que a única ligação entre o seriado e a franquia do cinema era a presença do veterano ator.

Mas se analisado com mais atenção, percebemos que o longa ultrapassa a mera “aventura de artes marciais”.

Dirigido pelo subestimado John G. Avildsen, vencedor do Oscar por Rocky – Um Lutador, outro filme sobre alguém que supera todas as expectativas, Karatê Kid foi contra a maré de muitos outras produções dos anos 1980, auge da era Reagan, que mostravam americanos ditando os passos em outros países (inclusive Rocky IV, quando o personagem de Sylvester Stallone é aplaudido pelo Primeiro Ministro soviético, na União Soviética, após derrotar um soviético!).

No caso de Karatê Kid, o protagonista é americano (Daniel) sim, mas é ensinado por um oriental (Miyagi).

Apesar do roteiro contar com o velho romance entre a garota rica (Ali) e um jovem plebeu (Daniel), a relação principal da trama, que sensibilizou pessoas em inúmeros países, era aquela entre Daniel e seu mestre. Uma amizade entre seres humanos com idades completamente diferentes. Relação de pai e filho. Amor fraternal.

Tudo isso somado à velha mensagem “todos podem vencer”, com certa ingenuidade, alguma ação, trilha sonora memorável e boas doses de comédia, serviu para que a obra fizesse sucesso de público e até rendesse parte da crítica. Êxito surpreendente para um filme que tinha um elenco desconhecido internacionalmente.

Apesar de longa carreira, Pat Morita (1932-1985) até então era um ator de comédias, principalmente em TV (fez até ponta na antiga série do Hulk). Mas seu desempenho como Mr. Miyagi beirou a perfeição e o reconhecimento veio com indicações ao Oscar e ao Globo de Ouro de Ator Coadjuvante.

Ralph Macchio, que um ano antes foi revelado em Vidas sem Rumo, de Francis Ford Copolla, na mesma leva de novos talentos que deu ao mundo Matt Dillon, Tom Cruise, Diane Lane, Patrick Swayze e Emilio Estévez, em 1984 já beirava os 24 anos, idade avançada para o personagem adolescente. Mas ninguém sentiu a diferença e o ator serviu como uma luva para viver Daniel. Depois, de importante mesmo ele só teria as atuações nas continuações de Karatê Kid e no bacana Meu Primo Vinny (1992), ficando relegado a papéis menos importantes no cinema e presença em seis episódios da série Betty, a Feia, entre 2008 e 2009.

Quem se tornou mais conhecida foi Elizabeth Shue (também com mais de 20 anos quando “Karatê kid” foi lançado), tanto pelo desempenho em filmes legais – Cocktail (1988), no qual dividiu a tela com Tom Cruise, e Despedida em Las Vegas (1995), que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz -, como também pelo seu jeito maluquete, dando em cima de repórteres e sem receio de expor a vida sexual.

Apesar das idades avançadas do casal de atores protagonista para encarnarem personagens teen, Karatê Kid levou dois prêmios no Young Artist Awards, nas categorias Melhor Filme Para a Família, e Melhor Nova Atriz Coadjuvante para Elizabeth Shue.

Mesmo com falhas visíveis em coreografias das lutas (numa delas, no último embate, quando Daniel vai golpear Johnny com um chute parece que ele oferece a perna para o rival segurá-la e contra-golpear), o longa é um clássico à sua maneira.

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Karate Kid 2

O “golpe da águia” virou hit entre a molecada. Frases ditas por Mr. Miyagi durante os treinos de Daniel tornaram-se célebres, como no diálogo:

Miyagi: – O karatê tem duas regras: A primeira é que ele serve apenas para defesa.

Daniel: – Qual é a segunda regra?

Miyagi: – Aprender bem a primeira.

Já algumas cenas são antológicas. Como a que Miyagi, apenas num golpe, quebra as pontas de três garrafas, e aquela em que ele esfrega as mãos para “curar” a perna do pupilo antes do combate decisivo. Até a dublagem brasileira marcou época. Um dos raros casos em que o trabalhos de dubladores é lembrado com carinho no Brasil. São fatores que parecem bobos para alguns, mas que para muita gente gera uma grande saudade.

Reprises e reprises foram exibidas na Sessão da Tarde, Temperatura Máxima, Intercine, etc, mas inacreditavelmente encontrá-lo em DVD no Brasil é algo raro. É preciso procurar no Submarino ou no Mercado Livre, ou dar a sorte de achá-lo em alguma locadora.

Com o sucesso três continuações foram produzidas. Karatê Kid 2 – A Hora da Verdade Continua (1986) levou Daniel e Miyagi ao Japão, num enredo mais dramático. O jovem americano deparava-se com um inimigo “real”, que pretendia matá-lo. No inferior Karatê Kid 3 – O Desafio Final (1989), a dupla retorna aos EUA e reencontra John Creeze, que pretende vingar-se e reabrir a Cobra kai. Ainda foi realizado o menos conhecido Karatê Kid 4 – A Nova Aventura, sem a presença de Ralph Macchio e com Miyagi treinando uma garota interpretada por uma certa Hilary Swank, que depois venceria duas vezes o Oscar, por Meninos Não Choram (1989) e Menina de Ouro (2004).

Até Will Smith percebeu o potencial universal da trama de “Karatê Kid” e decidiu produzir, por meio de sua empresa Overbook Entertainment, em parceria com o megaprodutor Jerry Weintraub (franquia Onze Homens e um Segredo) uma refilmagem (estréia marcada para 2010) batizada Kung Fu Kid, mantendo a essência do original, porém transportando a trama para a China, com seu filho Jaden Smith no papel de Dre (que seria Daniel) e Jackie Chan na pele do mestre.

Sobre aquelas brincadeiras relatadas no início desse texto, que preenchiam nossos tempos livres duas décadas atrás? Pois é, atualmente são motivo de conversas de bar entre marmanjos que se emocionam quando lembrar do filme. Bons tempos aqueles.

KARATE KID – A HORA DA VERDADE
John G. Avildsen
[The Karate Kid, EUA, 1984]